São João del-Rei possui núcleo de formação profissional em Filosofia Clínica

Encontro de Filosofia Clínica de BH homenageou Milton Nascimento e o Clube da Esquina.


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José Venâncio de Resende0

Adriano Valério e Ana Cristina, na foto oficial do Encontro em BH (foto cedida pela entrevistada).

Pouca gente sabe que São João del-Rei abriga o Instituto Mineiro de Filosofia Clínica (IMFIC), responsável pelo curso de formação de profissionais nesta área. As atividades (que abrangem palestras e extensão) são coordenadas pela filósofa clínica Ana Cristina da Conceição, sócia e professora no IMFIC. Ela graduou-se em Filosofia pela Universidade Federal de São João del- Rei (UFSJ), com pós-graduação em Filosofia Clínica pela Faculdade Itecne, de Cascavel (PR). A formação em Filosofia Clínica existe em São João desde os anos 2000, mas foi a partir de 2016, quando a coordenação passou para o IMFIC, que ela assumiu o curso.

Com a mudança no quadro societário esse ano, a sede do IMFIC instalou-se em São João del-Rei. “O trabalho que desenvolvemos aqui no polo é o de formar o estudante para ser um terapeuta, chamado filósofo clínico ou terapeuta filosófico; e também oferecemos palestras e curso de extensão”, explica Ana Cristina. “Essa formação é oferecida para as pessoas que possuem uma graduação reconhecida pelo MEC. Ela é composta pela parte teórica e os estágios.”

Inicialmente, essa formação tinha o formato presencial, mas, com a pandemia do Covid-19, migrou para o on-line e hoje funciona no formato híbrido presencial/on-line (neste mês de junho, as matrículas estão abertas para iniciar uma nova turma). Quem se tornou aluno do curso, em plena pandemia (desde 2020), foi o professor Adriano Valério Resende, membro do IRIS (Instituto Ribeirão Santo Antônio). Ele pensa em utilizar a Filosofia Clínica como referencial na educação. “O contexto escolar é desafiador devido à complexidade de realidades e de relações envolvidas no processo de ensino-aprendizagem.”

Filosofia Clínica na educação 

Para Adriano, a Filosofia Clínica tem muito a contribuir com o processo educacional, “visto que a escola é eminentemente um ambiente no qual as pessoas estão em constante relacionamento ou, em outras palavras, a escola é um local de interseção por excelência”. A qualidade do ensino-aprendizagem depende diretamente da interseção entre três atores principais: a escola, os professores e os alunos, explica. “O professor, por lidar com a diversidade humana, precisa ser um pesquisador, não apenas da área na qual atua, mas também da sua realidade e a das pessoas com quem trabalha. Além disso, no processo educativo, é primordial que professor estabeleça uma interseção positiva com o grupo de alunos.”

Nesse sentido, “seguindo os preceitos da Filosofia Clínica, é fundamental termos conhecimento da pessoa, do grupo ou da turma com a qual lidamos, o universo que habita ou coabita. Isso é determinante para a melhor escolha das estratégias, métodos e matérias para as aulas”. Citando a filósofa Mônica Aiub, ele observa que “o processo de aprendizagem está associado a dados circunstanciais, a fatores emocionais dos alunos e a aspectos existenciais diversos e variados”. Assim, “nos trâmites da Filosofia Clínica, é fundamental conhecer a base categorial dos atores com os quais o professor se relaciona diretamente, ou seja, a escola, o grupo de alunos e os outros professores. Sem esses dados, especialmente informações sobre os alunos, o terreno no qual trabalhamos é pantanoso e desconhecido”.

A professora Ana Cristina, embora admita não ter experiência com crianças e jovens, sabe, por relatos, que colegas que atuam em sala de aula com esse público específico “fazem uso dessa metodologia em suas atividades na escola”.

O que é a metodologia?

A metodologia a que se refere Ana Cristina foi proposta por Lúcio Packter, sistematizador da Filosofia Clínica no Brasil, e se divide em três momentos: exames categoriais com suas cinco categorias; estrutura de pensamento com seus 30 tópicos; e submodos com seus 32 submodos. “Com essa metodologia, conseguimos nos aproximar do sujeito que nos procura e assim observamos sua organização interna (estrutura de pensamento), seus modos de agir (submodos) e de onde ele vem (exames categoriais).”

A atuação de Ana Cristina em sala de aula consiste na formação de terapeutas/filósofos clínicos. “Lá eu utilizo o que esses três momentos nos oferecem, fazendo uma leitura desta estrutura coletiva, ou seja, a estrutura de pensamento da turma. E cada turma apresenta uma estrutura diferente; assim as formas de interação e proposta de atividades, com cada turma, seguem na mesma direção.”

Abordagem terapêutica

De forma resumida, a Filosofia Clínica é uma abordagem terapêutica, conceitua Ana Cristina. “Ela é mais uma opção que temos para encaminhar nossas questões existenciais, ou seja, nossas dores, conflitos, medos, relações conflituosas, entre tantas outras questões.” A novidade que a Filosofia Clínica oferece “é que o terapeuta busca, através de uma pesquisa na história de vida da pessoa, analisar como ela se movimenta existencialmente, seu jeito e modo de ser. Com essa pesquisa, ele se aproxima desta organização interna e consegue oferecer encaminhamentos/procedimentos que conversem de forma mais positiva com esse sujeito e assim encaminhar as questões que o levaram ao consultório. Isso nos afasta da ideia de que, se deu certo para um, vai dar certo para todos; ou seja, o atendimento se torna único, personalizado”.

Indo um pouco mais a fundo: “A Filosofia Clínica nos ensina (e colabora) a vivenciar com mais autenticidade nossas relações. Abrindo nossa percepção para a proposta da singularidade, muito aprenderemos sobre nós mesmos e sobre aqueles com quem convivemos”, conclui Ana Cristina.

O Encontro de Belo Horizonte

O compositor do Clube da Esquina, Milton Nascimento, foi homenageado no XXI Encontro Mineiro de Filosofia Clínica, que aconteceu entre os dias 30 de maio e 1º de junho em Belo Horizonte. Com a temática “Eu, Caçador de Mim - um agradecimento ao Bituca”, a abertura do evento trouxe a historicidade de Bituca e muita música no Bar do Museu do Clube da Esquina, localizado no bairro Santa Tereza da capital mineira. Este bar, inaugurado em 2015, está localizado a poucos metros da famosa esquina entre as ruas Paraisópolis e Divinópolis. O movimento Clube da Esquina é considerado um dos mais importantes da música brasileira, influenciou gerações e projetou a música mineira para o Brasil e o mundo.

Nos dois dias seguintes, os trabalhos encontro, organizado pelo Instituto Mineiro de Filosofia Clínica (IMFIC), aconteceram na PUC Minas - Campus Coração Eucarístico. A programação contou com mostra de poesias e fotografias; rodas de prosa tendo como temática três músicas cantadas por Milton (Bola de meia, bola de gude; Quem sabe isso quer dizer amor e Paula e Bebeto); oficina sensorial a partir da música Benke e oficina de Dados de Semiose (grupo bordAção) com a temática da música Maria solidária.

O Encontro Mineiro de Filosofia Clìnica acontece em Minas Gerais desde os anos 2000, logo depois do início do curso de formação no Estado. A finalidade deste evento é a de proporcionar aos estudantes, pesquisadores, especialistas e interessados neste conhecimento “um momento de partilha e troca de saberes e a prática da Filosofia Clínica”.  

LINKS RELACIONADOS:

Instituto Mineiro de Filosofia Clínica  

Filosofia Clínica

 

 

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