Voltar a todos os posts

Chama o síndico!

25 de Janeiro de 2024, por Renato Ruas Pinto

O “síndico” Tim Maia, passados quase 26 anos desde que nos deixou, continua presente e sendo lembrado e ouvido como merece. Há alguns anos o seu nome voltou à baila, com a sua cinebiografia, também adaptada para o formato de minissérie. Embora eu tenha várias críticas ao filme, é sempre bom ver a obra de um artista tão relevante ser resgatada. Não pretendo elaborar neste espaço meus comentários sobre o filme, mas, por achá-lo superficial e tratar do Tim Maia de forma meio caricatural, fiquei curioso para saber mais sobre sua história, quando entrei em contato com dois materiais relacionados e de autoria do produtor musical e escritor Nelson Motta.

Os materiais são a biografia “Vale tudo: o som e a fúria de Tim Maia”, publicada em 2007, e a série documental “Vale tudo com Tim Maia”, de 2022, cuja direção é assinada por Nelson Motta e Renato Terra. A série não segue um formato tradicional de documentário, com uma narração de terceiros, mas faz um ótimo apanhado de imagens, entrevistas e videoclipes do artista. Possivelmente, boa parte deve ter sido levantada durante a pesquisa do livro, já que é possível reconhecer várias de suas passagens enquanto se assiste à série, disponível no Globoplay.

O livro, por sua vez, conta a história singular do artista em ordem cronológica. Nelson Motta foi um amigo próximo de Tim Maia, além de ter sido um executivo da indústria da música, o que traz algumas passagens contadas em primeira mão e outras provavelmente ouvidas de pessoas próximas. A leitura do livro, porém, me deixou com a impressão – que foi confirmada após assistir à série documental – de que a pesquisa foi um pouco limitada e baseada em boa parte em material de jornais e entrevistas para a televisão. Considero, porém, um problema menor e foi muito interessante conhecer a história e trajetória de Tim Maia sem a visão simplista mostrada no filme.

Nelson Motta conseguiu mostrar, sem retoques, que Tim Maia era uma figura complexa e contraditória que reunia, no mesmo corpanzil, um talento único para música e uma falta de profissionalismo sem paralelo ou um romântico que ia da doçura à explosão em segundos. No livro também está presente o consumidor de doses cavalares de uísque, cocaína e maconha, prática que Tim chamava de “triatlo”, e o artista que tinha noção de que a classe era constantemente lesada pelos executivos da indústria da música e tentou tomar as rédeas da própria carreira, atuando como empresário, editor e administrador de seu selo e editora. Embora tenha falhado miseravelmente atuando do lado do negócio, essa é uma parte de sua vida muito interessante e que o livro mostra muito bem.

Falar do talento de Tim Maia como compositor é algo quase desnecessário quando se olha a longa lista de grandes sucessos que ele compôs e arranjou brilhantemente, mesmo sem saber colocar uma nota em uma partitura. Nelson Motta, porém, no seu livro faz um bem ao destacar suas qualidades de intérprete e com um ótimo faro para identificar grandes músicas. Ao falar do intérprete, Nelson Motta ainda faz justiça a compositores que impulsionaram a carreira de Tim Maia, como Cassiano, autor de “Primavera” e outras três músicas de seu primeiro disco, mas que foi solenemente ignorado no filme. A lista de sucessos compostas por terceiros é longa, como “Descobridor dos sete mares”, “Gostava tanto de você” e “Leva”. Suas interpretações memoráveis, naturalmente, fizeram com que o público as associasse automaticamente a Tim.

Uma figura complexa e controversa como Tim Maia merecia uma biografia. Ainda que a de Nelson Motta não seja exatamente primorosa, é uma leitura agradável e que acrescenta dimensões interessantes a um nome fundamental da música brasileira, o artista que soube misturar os importados soul e funk aos ritmos brasileiros. Mais do que o artista que faltava a shows frequentemente ou o dono de uma voz potente e cheio de suingue, Tim Maia tem outros tantos predicados – alguns positivos e outros não – que fizeram o que ele foi e ainda é.

Deixe um comentário

Faça o login e deixe seu comentário