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Ecos do cânion

29 de Marco de 2023, por Renato Ruas Pinto

Os serviços de streaming em vídeo têm nos trazido documentários interessantes sobre música, falando de artistas, eventos ou movimentos. Esses documentários nos dão a oportunidade de conhecer as histórias de bastidores ou saber de detalhes que passariam despercebidos, por exemplo, ao ouvir certos discos. Recentemente pude assistir no Netflix a alguns documentários muito bons e pretendo comentar sobre aqueles que considero mais relevantes. Nesta edição, falarei sobre um, cujo tema nos remete aos agitados anos 60, período de efervescência do rock. Trata-se de “Echo in The Canyon – uma celebração à música”, de 2018, e que faz um recorte interessante sobre uma região de Los Angeles e a influência que seus ilustres moradores tiveram sobre a música do período.

O documentário, apresentado por Jakob Dylan, filho de Bob Dylan e líder da banda The Wallflowers, que gozou de algum sucesso nos anos 90, conta a história do Laurel Canyon e seus moradores famosos. Laurel Canyon é uma região montanhosa da metrópole Los Angeles e com um certo ar rural. Além do cinema, Los Angeles sempre foi um dos mais importantes centros da indústria da música, reunindo uma série de estúdios de porte e escritórios de grandes gravadoras. Assim, vários artistas sempre tiveram moradia em seu entorno. Um certo isolamento e um ar interiorano de montanha, mas logo ao lado da cidade gigante de concreto e aço, possivelmente foram decisivos para atrair uma série de músicos que por lá se instalaram.

O documentário trata justamente desse ambiente musical que reuniu artistas como o quarteto The Mamas & The Papas, os Byrds, de Roger McGuinn e David Crosby, e Brian Wilson, o inspirado compositor dos Beach Boys, além de outros tantos expoentes do rock e da contracultura dos anos 60. É natural que, com tanta gente talentosa reunida, o intercâmbio entre essas pessoas fosse frequente. Além de surgirem colaborações formais entre músicos, os encontros em festas, reuniões ou visitas privadas faziam com que os músicos estivessem sempre apresentando os rascunhos de seus trabalhos para pares exigentes, gerando um clima prolífico de composições de qualidade cada vez mais alta. O ambiente permitiu também a aproximação de músicos para somarem forças, como foi o caso do quarteto Crosby, Stills, Nash & Young. David Crosby havia sido expulso do The Byrds mais ou menos na mesma época quando o Buffalo Springfield de Neil Young e Stephen Stills se dissolveu.

No documentário, Jakob Dylan entrevista vários dos personagens que fizeram parte dessa cena e que revivem histórias e fazem análises interessantes do ambiente, das músicas e de um mundo que passava por rápida transformação no fim dos anos 60. É curioso poder ouvir em primeira mão essas narrativas, até para entender como era o processo criativo de vários artistas e saber mais sobre um momento crucial da arte popular. Todo esse intercâmbio e colaboração, a meu ver, não fez com que o que aconteceu no Laurel Canyon pudesse ser chamado de um “movimento”, isto é, quando vários artistas caminham claramente na construção de uma determinada estética. Ainda assim, o que se produziu ali naquele período será escutado e estudado por muitos anos.

Além disso, é de se esperar que não faltem histórias engraçadas envolvendo a excentricidade dos artistas, como a curiosa caixa de areia que Brian Wilson colocou em sua sala de visitas para acomodar seu piano. Ou histórias narrando os incontáveis problemas com a polícia por conta de festas com música alta ou, é claro, das drogas ilícitas, como a maconha ou o LSD, que estão invariavelmente associadas a esse período. Finalmente, o documentário faz um resgate musical muito interessante da época, com clássicos interpretados por Jakob e convidados de peso, como Fionna Apple, Norah Jones e Beck.

Enfim, é um documentário mais do que recomendado não só para quem curte e conhece a música do final dos anos 60, mas também para o ouvinte casual que tem a chance de descobrir novas músicas e artistas que merecem estar em qualquer playlist.

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