Dizem que santo de casa não faz milagre. No futebol, essa máxima vira, mexe e ressurge quase sempre quando um técnico brasileiro assume a seleção e carrega nos ombros não só uma prancheta, mas um rosário de expectativas. A chegada do treinador italiano Carlo Ancelotti, nome de peso, currículo europeu e passagens por grandes clubes, reacendeu aquela centelha de esperança no torcedor. Afinal, se não é milagreiro, ao menos parece saber de bola.
Mas há contextos em que nem milagre resolve. E talvez seja esse o maior desafio do novo comandante: separar o que é fé do que é futebol, o que é simbólico do que é prático. Porque a seleção brasileira, a mesma que um dia encantou o mundo com dribles, gols e gingado, hoje sangra. Sangra em campo, na criação travada, na defesa perdida, na ausência de um meio-campo que pense. Sangra fora dele, em decisões administrativas desconexas e confusas, em projetos de longo prazo que não duram dois amistosos.
E aí veio ela: a camisa vermelha. Para alguns, heresia. Para outros, apenas marketing. Politizaram mais uma vez! Mas o tom rubro, para mim, veio como um lembrete incômodo: o futebol brasileiro sangra, e a nova camisa apenas mascara a ferida.
É curioso pensar nas cores da camisa da seleção. A amarela é orgulho, é história. A azul, superstição boa — de 58 e 94, e o manto azul de Nossa Senhora vestiu Pelé no primeiro título mundial da seleção. A verde, ocasional e discreta. A branca já foi a principal até ser deixada de lado em 1950, junto com o Maracanaço. A vermelha, agora, parece carregar mais do que tecido: traz o peso do estranhamento, da provocação, da ruptura. Mas uniforme nenhum ganha jogo. Camisa bonita pode até inspirar, mas não segura o meio-campo adversário, não arma contra-ataque, não mata bola no peito.
Ancelotti, santo ou não, entra em campo com um grupo jovem, alguns nomes conhecidos, outros ainda em fase de teste. E o torcedor, que entre um meme e outro ainda torce, observa com desconfiança. Porque a paixão segue ali, mas o brilho nos olhos se apagou faz tempo.
No fim das contas, a missão do novo técnico talvez seja menos sobre milagre e mais sobre resgate. Resgatar o prazer de jogar. A identidade perdida. A conexão com as arquibancadas. Entre a camisa amarela, azul, verde ou até vermelha, o que importa mesmo é o futebol. E esse, infelizmente, ainda segue precisando de cuidados — antes que sangre de vez.
Por enquanto, seguimos esperando. Entre uma camisa com cor que não faz parte da bandeira e um técnico que não é brasileiro, eu espero que milagres aconteçam! O que me resta para além disso é desejar boas-vindas ao Ancelotti!