Resende Costa apresenta características de uma cidade profundamente católica, em que a devoção mariana se faz presente em diversos aspectos da cultura e da religiosidade locais, não sendo difícil encontrar pelas ruas pequenas edificações em homenagem a Nossa Senhora. Foi movido por esse sentimento de devoção que, em meados dos anos 1960, o senhor Aristides Rodrigues Vale, (o popular Titide) fez com que a porção de moradores localizada no entorno das Lajes de Baixo se sentisse mais próxima da Mãe de Jesus Cristo. Para isso, Titide edificou, encrustada na enorme pedreira, uma gruta dedicada a Nossa Senhora, tendo como orago o título de sua célebre aparição em Lourdes, na região dos Altos Pirenéus na França.
Titide era uma figura reconhecida por ser um homem virtuoso, extremamente religioso e exímio devoto de Nossa Senhora. Seu costume preferido era falar com as pessoas sobre a Virgem Maria. Ficava sob sua responsabilidade no passado a oração diária dos mistérios do rosário na Igreja Matriz. A pequena gruta, edificada por Titide, sempre foi ponto de parada para tantos transeuntes que por ali passam, onde se pode rezar, mesmo que de forma quase involuntária, a invocação “Ó Maria concebida sem pecado, rogai por nós que recorremos a Vós”. Não são poucos os moradores que ainda se lembram da gruta na época em que seu idealizador zelava por ela. Tamanho carinho era visível por todos.
Com a morte de Titide, a gruta passou aos cuidados de seu sobrinho José Ramos, o Zezinho do Célio, que mantinha na medida do possível o ambiente da gruta organizado e limpo. Mas, como a gruta se localiza em um logradouro público e que já sentia o passar dos anos e até mesmo certo descaso das pessoas, tornou-se aos poucos um depósito de imagens de santos quebradas. Consternada com essa situação, Maria Lúcia Pinto (Lucinha do Góes) tomou a iniciativa e solicitou na prefeitura a autorização para revitalizar a gruta. Arregaçando as mangas, Lucinha foi em busca de ajuda para fazer esse desejo acontecer, e em julho do ano passado se iniciaram as obras. A imagem de Nossa Senhora, medindo 65 centímetros, foi retirada pela primeira vez, depois de muitos anos, do interior da gruta, extremamente danificada e deteriorada pelo passar do tempo e pela umidade advinda do afloramento de rocha em que ficava localizada.
A notícia do restauro da imagem chegou ao conterrâneo padre Adriano Tércio, que a enviou para o renomado restaurador são-joanense Carlos Magno de Araújo, que conduziu os trabalhos de restauração, reconstituição de partes faltantes, melhorias na carnação e policromia da peça, mantendo tudo sempre fiel ao original há anos venerado em Resende Costa. E depois de muita espera e ansiedade, a imagem retornou para o povo, ficando custodiada por um período na casa dos saudosos José Nicodemos e Maria Laura.
Reinauguração
Na última quinta-feira, 15, foi marcado o retorno da imagem para o seu eterno trono, humilde e simples, elaborado pela devoção e resguardado por providência Divina. Providência esta que não faltou nem mesmo no dia do retorno da imagem, afinal a data foi justamente o dia 15 de agosto, dia da Assunção de Nossa Senhora.
Na hora marcada, os fiéis, reunidos para a bênção, saíram em cortejo da Praça Maestro João Augusto dos Reis, andando por poucos metros até a gruta, entoando cantos católicos populares. Chegando ao local, o povo, emocionado entre gritos de “viva” e muitos aplausos, receberam a mais ilustre moradora dessa vizinhança. Nossa Senhora estava de volta à sua casa, depois de um pouco mais de um ano. Ela parecia trocar olhares com seus devotos, um olhar vivo, imaginado pela habilidade do artista que a esculpiu, o escultor resende-costense Valcides Arvelos, e reforçado com um novo brilho na recente restauração.
Os atos foram assistidos pelo vigário paroquial da Paróquia de Nossa Senhora da Penha de França, padre Rutiero Ruan de Carvalho, que, depois de realizar o rito de bênção da imagem restaurada, conduziu o terço, meditando os mistérios gloriosos. Ao final do terço, uma coroação foi realizada pelas crianças residentes nas proximidades da gruta e organizada por Lucinha e Dona Lilia Pinto, que auxiliaram na entonação das músicas. Ao término, novamente entusiasmados, os moradores se aproximaram da imagem para elevar súplicas e contemplá-la mesmo que por alguns instantes. Em seguida, a imagem foi recolocada no lugar pelas mãos do padre Rutiero, juntamente com uma imagem contemporânea, feita de resina, de Santa Bernadete, a jovem que em 1858 teve a graça de testemunhar a visão miraculosa de Nossa Senhora na gruta francesa. Reproduziu-se, assim, no interior da gruta lageana, a cena da aparição de Lourdes.
A gruta não está totalmente concluída, ainda receberá iluminação e reforços na segurança. Cabe agora à população conservar esse patrimônio, que, independente de religião e crença, faz parte da cultura e do cotidiano do nosso povo. Em razão disso, é dever de todos nós lutarmos por sua preservação e, quem sabe, essa iniciativa popular não comova as nossas autoridades para uma futura (e sonhada) reforma, com melhorias e cuidados na gruta das Lajes de Cima, que hoje, infelizmente, já não tem mais o brilho de outrora. Que essas tantas mãos que ajudaram nesse projeto possam ser recompensadas e guardadas sob o olhar materno da homenageada.
*Graduando em História na UFSJ.
