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Arroz sem feijão

15 de Janeiro de 2014, por Cláudio Ruas

As festas de fim de ano se passaram, com seus deliciosos banquetes. Além dos perdoáveis quilos a mais na balança, também surge logo em seguida um automático desejo pela comida trivial, do dia a dia. E a primeira coisa que vem à cabeça é a dupla imbatível “arroz com feijão”, da qual somos verdadeiros dependentes. Realmente é uma combinação perfeita e uma conchada de feijão cai como uma luva por cima do arroz branco, ao ponto de acharmos improvável que o resto do mundo não siga essa “religião” (de fato não segue). Porém, apesar de devoto fidelíssimo, entendo que o arroz também pode sobreviver muito bem sem o feijão em alguns casos e em dias normais, não somente em refeições comemorativas. Escravizá-lo a essa combinação – por mais brilhante que ela seja – é um pecado com esse grão tão versátil e especial.

Originário do oriente, onde é base da alimentação de muitos países até hoje, o arroz também veio para o Brasil nos embornais dos portugueses, apesar de que os índios já consumiam uma espécie selvagem, que eles chamavam de “milho d’água”. Com o passar dos anos o arroz se alastrou pelos brejos e campos alagados, ambiente em que ele cresce sem dó, quando a passarinhada deixa. Grande parte do arroz brasileiro vem do sul do país, mas uma região vem se destacando cada vez mais, a do Vale do Paraíba, em São Paulo. É de lá que vem uma variedade nova, genuinamente brasileira e que tem chamado a atenção entre as mais de 140.000(!) em todo mundo: o mini-arroz. Outros tipos como o cateto, o vermelho e o preto vêm, embora muito timidamente, ganhando as prateleiras dos supermercados e o gosto dos cozinheiros, haja vista seus sabores e texturas diferenciados, além da vantagem nutricional em relação ao nosso arroz do dia a dia.

De volta para cozinha e tendo à mão o arroz branco (dormido ou não), é hora de aproveitar a infinidade de combinações que ele permite com praticamente todos ingredientes possíveis, de verduras a legumes, de carnes a peixes e de castanhas a frutas. Mas sem o infantil preconceito de se tratar o resultado final como um mero “mexidão” de fim de noite, daqueles que levam tudo que tem sobrando na geladeira, até cola super bonder e pedaço de carvão. Mesmo porque esse é um prato que merece o seu respeito - quando bem feito, claro.

Sou um grande adepto de um “arroz de...”, que geralmente preparo tendo como base um refogado de cebola, alho, outros legumes (como tomate), verduras (nossa boa e velha couve vai muito bem) e alguma proteína (uma linguiça, ou carne seca, ou camarão, etc), que por sua vez acaba sendo a estrela do prato. Já o arroz é misturado só ao final e já cozido, embora outras receitas interessantes permitam que ele cozinhe junto com os ingredientes. Caso da apetitosa paella espanhola e do aconchegante risotto italiano, que nos seus países de origem – e também por aqui - não sofrem o preconceito do estereótipo de mexido.

Percebe-se de uns anos para cá em restaurantes, jantares, livros e receitas, uma espécie de “ditadura do risoto italiano”, servido e falado à exaustão. Nada contra ele, muito pelo contrário. Mas, como bem disse o respeitável repórter gastronômico do Jornal Estado Minas Eduardo Girão em seu blog: “Alô, chefs, risoto é uma delícia, mas vamos dar uma variada! Um arroz caldoso, como dizem os espanhóis, é tão bom quanto um risoto! Prazeres distintos, afinal de contas!

A vida passa muito rápido para deixarmos de aproveitar ao máximo o tanto de coisa boa que temos à nossa volta. Aproveitar inclusive um prazer a mais ao comer o tradicional, que só os momentos de distância a ele são capazes de proporcionar.

 

 

(Nossa receita é para aproveitar as taiobas que pipocam da terra nessa época do ano: “Arroz de arado - com açafrão, taioba e linguiça enfumaçada”:  www.casalgastromg.blogspot.com.br)

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