– E aí, meu bem? Que tal?
A primeira reação do marido foi de estranhamento. Depois que sua retina se apaziguou, Francinildo afinal pôde constatar o facilmente constatável: sua mulher parecia uma zebra.
– Gostou ou não gostou, meu bem?
– É... o... quer dizer... acho que se... isto é...
Darcilene era muito sensível. Qualquer crítica e era um Deus nos acuda. Chantagens, lágrimas, xingamentos... E aí, já era o jantar de bodas de prata do amigo senador. Mas a verdade é que Darcilene estava ridícula naquele vestido listrado. Nem mesmo em teatro infantil alguém se vestiu tão igual a uma zebra. E aquele chapéu? As franjinhas caídas de cada lado. Até crina a zebra tinha!
– Você está meio quieto, Francinildo. Acho que é o chapéu.
Até que enfim! Pelo menos, ela iria sem aquela escovinha mole em cima da cabeça. Porém, Darcilene apenas mudou a posição do chapéu, realçando ainda mais a crina. Francinildo já estava temeroso de haver alguém do Ibama na festa.
Quando chegaram à casa do senador, aquele clima chique. Muita gente, decoração requintada, música tocando, algumas rodinhas formadas, garçons que nem pinguins atarefados, petiscos variados e bebidas finas. O casal cumprimentou o senador e a esposa, que, por sinal, muito magra e alta e naquele vestido longo apertado, lembrava uma jiboia refinada. Depois dos abraços, beijinhos e elogios descarados, Francinildo e Darcilene procuraram se enturmar. E cada um foi pro seu lado.
De longe, Francinildo observava Darcilene. Ao lado dela, uma senhora toda de oncinha. Um tailleur e uma saia até o meio da canela, tudo imitando pele de onça. Uma outra usava uma echarpe peluda, igualzinho juba de leão. Uma zebra entre uma onça e um leão. Darcilene não sabia o risco que estava correndo.
O tempo passou e, lá pelas tantas, um grito. Francinildo imaginou o pior: a sua zebra acabara de ser devorada. Mas não. Era a jiboia do senador dando um grito de emoção quando o marido pegou o cavaquinho e começou a tocar o “Urubu Malandro”. Mais um bicho.
Depois disso, os músicos capricharam em outros ritmos e todo mundo começou a dançar. Francinildo dançou com a zebra, rodopiou com o leão, pulou com a onça e pisou no rabo da jiboia. Noite inesquecível. Francinildo era uma mistura de Noé profano e Tarzan folião. No momento, ele dançava com a Rosenda. Loura, toda de verde, quase parada e balançando apenas o pescoço: um papagaio. De repente, Darcilene:
– Você só dançou uma vez comigo. Vamos dançar de novo?
– É claro, minha zebrinha!
Não precisou de mais nada. A zebra virou jararaca e pisou duro. Darcilene fechou a cara e quis ir embora. Para ela, a festa tinha acabado.
No caminho, Francinildo ainda tentou contornar, dizendo que a zebra era um animalzinho engraçadinho, que as listras da zebra eram fantásticas, que o vestido era uma elegância só... Até inventou que no Bangladesh a zebra é o símbolo da sensualidade feminina. Não adiantou.
Tem uma semana que a Darcilene dorme sozinha no quarto e o Francinildo no sofá. Mas isso passa logo. Ontem mesmo ele viu a esposa chegando com uma porção de sacolas de compras. Havia algumas peças de couro.
Sadomasoquismo? Não... Darcilene nunca foi chegada nessas coisas.
Acho que está vindo um jacaré por aí.