De olho na cidade

O SUICÍDIO e sua incidência em Resende Costa

15 de Janeiro de 2019, por Edésio Lara 1

Sociólogos, filósofos, religiosos e especialistas da área da saúde se debruçam sobre um tema que preocupa e muito: o autoextermínio – o suicídio – que é praticado em todos os países do mundo. Não há números, registros estatísticos seguros sobre a prática de pôr fim à própria vida, mas eles são elevados. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 800.000 pessoas se matam a cada ano no mundo. Pode-se dizer que a cada 40 segundos uma pessoa decide dar fim à própria vida em algum lugar do planeta.

Atualmente, o autoextermínio é a segunda causa de morte entre jovens com idades que vão de 15 a 29 anos. No Brasil, de acordo com o Ministério da Saúde, em 2015 foram registrados 11.178 suicídios e em 2016, 11.433, um aumento de 2,8%. Desde 2007, o número cresceu 18%, sendo sua incidência entre os homens, superior ao de mulheres. As informações referentes a 2017 e 2018 ainda não foram divulgadas.

O suicídio é tratado como uma questão de saúde pública que pode ser prevenido. Não nos custa lembrar que os suicidas não pertencem a uma classe social distinta. Eles não estão somente entre os mais pobres ou mais ricos nem em localidades específicas. O suicídio ocorre também entre ricos e famosos, religiosos, militares e até entre os que se destacam e se empenham em cuidar da saúde dos outros.

O IBGE, em sua página na internet, estimou a população de Resende Costa em 11.459 pessoas no ano de 2018. Exatamente entre setembro e dezembro do ano passado ocorreram três mortes por suicídio na cidade. Todos eram do sexo masculino. Antes, porém, uma mulher da zona rural já havia tirado a própria vida. Na cidade é comum ouvirmos dizer do índice elevado de suicídios no município. E parece não haver dúvidas quanto a isso. Quatro mortes em um ano – número que consideramos alto para uma cidade pequena como a nossa – refletem, no entanto, o que acontece no país. E esse é um dado estatístico que não nos alegra. Muito pelo contrário, deixa-nos tristes, senão, preocupados.

De acordo com o policial civil Gláucio Wallacy, cuja atuação também se estende às cidades de Lagoa Dourada e Coronel Xavier Chaves e lida com boletins de ocorrência relativos às mortes dessa natureza, em Resende Costa entre os anos de 2016 e 2018 ocorreram 11 suicídios. Nas estatísticas, não aparecem os casos nem o número daquelas pessoas que tentaram o suicídio, sendo, no entanto, socorridas a tempo.

Quais os porquês para tantos suicídios em Resende Costa? Não sabemos ao certo, visto que as suas causas precisariam ser estudadas. Entre tantos motivos, podemos destacar: medo de falhar, cobranças diversas e excessivas, dificuldades financeiras, desavenças familiares, conflitos relacionados à identidade sexual, relacionamento amoroso rompido, morte de ente querido, baixa autoestima, traumas sofridos na infância e adolescência que persistem na idade adulta, esgotamento profissional – também conhecido como Síndrome de Burnoute, comum entre profissionais de diversas áreas, como a da educação, por exemplo – e pressão por alta produtividade nos ambientes de trabalho estão entre as inúmeras causas que induzem a pessoa ao suicídio.

Por vezes elas são potencializadas quando a pessoa, em vez de procurar auxílio de especialista, tenta resolver suas dificuldades através do consumo de bebidas alcoólicas e drogas. Por isso os pensamentos de morte, que os especialistas chamam de “ideação suicida”, levam a pessoa à primeira tentativa de autoextermínio, que pode ser consumada ou não. A depressão, uma das tantas causas que culminam no suicídio, é algo grave e recorrente. É um mal que precisa ser tratado por profissionais capacitados, especialmente por psicólogos e psiquiatras. Acreditar que ela é própria daqueles que não têm Deus no coração é outro erro grave.

A morte, quando ocorre por consequência do suicídio, deixa marcas profundas entre aqueles pertencentes ao grupo social do morto. E muitos ficam a perguntar: “Por que fulano fez isso?” “Quais as razões que levaram a pessoa a se matar?” Em alguns casos, familiares e amigos, pessoas mais íntimas que acompanharam o sofrimento daquele que se foi, têm respostas para o acontecido; outros, não.

As últimas três mortes por suicídio em Resende Costa ocorreram exatamente entre meses em que são realizadas as campanhas “Setembro Amarelo” (destina-se à conscientização sobre a importância da prevenção do suicídio) e “Janeiro Branco” (objetiva mobilizar a sociedade em favor da saúde mental), idealizadas e destinadas a chamar a atenção de todos para os casos de depressão e que podem levar à morte através do suicídio.

O tabu relacionado à morte por suicídio, ao que parece, tem ficado para trás. Por um lado, tratar do assunto pelo viés da saúde pública é fato que merece atenção e ampla divulgação. Por outro, como tem acontecido, de somente noticiar o episódio via redes sociais, publicando fotos e fatos envolvendo o suicida, é péssimo. É desumanidade, perversidade pura. Parece até competição: quem noticiou primeiro e publicou aquilo que merecia discrição em respeito à memória do falecido e ao sofrimento de seus entes queridos.

Essa necessidade de mostrar-se publicando e comentando sem qualquer escrúpulo o ocorrido, motivos que devem interessar somente aos mais próximos e responsáveis pelo acompanhamento do falecido, é ruim. Isso não ajuda em nada; somente torna maior a dor dos que ficam. Devemos despotencializar notícias como essas e dar publicidade ampla aos programas e organizações de ajuda que contribuem para retirar pessoas do fundo do poço e a salvar vidas.

Resende Costa do passado e do presente

12 de Dezembro de 2018, por Edésio Lara 0

Quem se lembra de Resende Costa dos anos 1980 e até a década seguinte e a vê atualmente fica espantado, senão admirado. A cidade mudou muito, não há dúvida. Surgiram novos bairros, novos logradouros e edificações. Por outro lado, desapareceram aquelas casas com quintais enormes, arborizados, com árvores frutíferas. Era possível, na maioria das casas, criar galinhas, porcos, plantar as folhas e os legumes que iam parar nas refeições dos próprios moradores. Esses espaços que ainda chamamos de horta começaram a deixar de existir. Foram sendo divididos para dar lugar a garagens, ampliar residências ou até a construção de lojas ou outras moradias. Assim está o centro da cidade. Nos bairros, em sua maioria, o que se veem são lotes pequenos que mal dão conta de receber uma residência. Espaços destinados ao lazer a às hortas, pelo visto, são coisas do passado.

Outra consequência desse crescimento nota-se facilmente na mudança radical da aparência da cidade. Lindos casarões deram lugar a outras edificações que nada têm a ver com a paisagem do lugar. Sobraram poucos imóveis capazes de ajudar a contar um pouco da história da nossa antiga Resende Costa. Um dó. Aquela cidade cheia de espaços que lhe garantiam uma claridade e um frescor que se pode perceber nas fotografias ou na voz dos mais velhos, já era. Isto porque construção nova e agarrada noutra – resultado dessa modernidade – não é garantia de conforto, funcionalidade e beleza.  

Pois é devido a esse crescimento desordenado que percebemos dia a dia como a transformação pela qual passa a cidade tem seus resultados nefastos. Praças foram diminuídas para darem lugar a prédio de telefônica, moradia e loja. Uma caixa d’água foi construída no ponto mais alto e belo da cidade, com impacto extremamente negativo para o lugar. O espaço de lazer mais visitado e apreciado pelos da cidade e para quem a visita foi brutalmente alterado. Dificilmente voltará ao que era. Das três lajes que eram uma das marcas características da cidade restam duas, que vêm sofrendo com o descaso, com o abandono e com a perda da sua área. Basta olharmos em sua direção para notar que aos poucos elas vão sendo encobertas por edifícios.

Recentemente fomos surpreendidos por uma ampliação do prédio onde fica a Rádio Inconfidentes FM. O puxadinho se estendeu em direção à gruta de Nossa Senhora de Fátima, construída na década de 1960. O lugar visitado por muitos devotos da Santa já não é mais o mesmo. Houve questionamento, mas, como a gruta não passou por processo de tombamento pelo Conselho Municipal de Patrimônio e Cultura de Resende Costa e não houve posicionamento contrário de qualquer órgão municipal, assistimos a mais uma ação que só vai impactar negativamente no já degradado espaço das lajes da Matriz. O Conselho Municipal de Patrimônio e Cultura, em contato com a direção da rádio, teve acesso ao projeto de ampliação do prédio, mas nada pode fazer. Ficou evidente que há também dúvidas acerca da propriedade do imóvel. Tentamos, em vão, ter contato com o proprietário em busca de solução que pudesse suspender a construção do anexo, ou minimizar os impactos causados pela construção do puxadinho. É com intervenções como essa, e que vêm acontecendo rapidamente, que traços característicos da nossa antiga terra vão se apagando.

Assim caminhamos com nossa cidade que vem sendo transformada e vendo o entorno de prédios já tombados, como é o caso da igreja Matriz, sendo alterados. Optamos por uma atitude que busque preservar o que nos resta de bens patrimoniais ou, em curto espaço de tempo, os laços que nos unem ao passado, estarão completamente rompidos.

Memórias de infância

13 de Novembro de 2018, por Edésio Lara 1

Antigo bebedouro da Escola Estadual Assis Resende (Foto André Eustáquio)

Sempre que retorno à Escola Estadual Assis Resende, me vem certa nostalgia. A ela retornei no último mês durante as eleições para deputado, senador, governador e presidente da República. Ali concluí meus estudos, os quatro anos de grupo, o que hoje corresponde aos quatro primeiros anos do ensino fundamental. Naquela época, completar os quatro anos de estudo era uma glória. Seguir estudos e conseguir concluir o ginásio – segunda etapa de mais quatro anos – era motivo de grande festa. Muitos hão de recordar da vinda a Resende Costa do craque Tostão, jogador do Cruzeiro e campeão do mundo em 1970. Terminada a Copa, que pudemos assistir pela TV pela primeira vez com imagens coloridas, ele veio direto para nossa cidade, convidado para ser paraninfo da turma que se formou naquele ano.

O prédio da escola, erigido há exatos 99 anos, já não atende de forma adequada aos seus servidores e alunos. Duas obras destinadas a ampliações foram necessárias para abrigar número cada vez crescente de alunos. A primeira, de 1989, ocupou o espaço antigamente destinado ao refeitório dos alunos, quando tínhamos merenda farta e de qualidade. A segunda, realizada em 2006, tomou lugar da área de lazer dos alunos. Ela era arborizada e possuía plataforma que chamávamos de auditório. Diante dessa plataforma nos reuníamos todos os dias para ouvir avisos, assistir a apresentações artísticas e, perfilados, cantar os cânticos de época do calendário acadêmico, civil e religioso. Há pessoas as quais sempre guardei na memória com carinho, tais como a minha tia Donana, cantineira, e o senhor Geraldo de Paula Magela. Ele nos ajudava a apanhar frutos da enorme ameixeira e a apontar, com seu canivete afiado, nossos lápis – não tínhamos lapiseiras ou canetas –; além, é claro, de atuar como porteiro da escola. O ofício lhe rendeu a forma como o chamávamos e com a qual ficou conhecido: Geraldo Porteiro.  

Não havia pais que ousassem contrariar decisões e atitudes das professoras. Tínhamos por elas um misto de respeito e certo medo. Donas de autoridade absoluta sobre nós sem que tivessem para isso de usar da força ou do desrespeito, tinham o respaldo dos pais em suas decisões. Mas, mediante falta considerada grave, a punição vinha na forma de castigos e das famosas cópias de frases enormes recheadas de advertências, que geralmente começavam com o Não devo fazer ... À gravidade da “arte” correspondiam o tamanho da frase e a quantidade de cópias a fazer: 100, 200, ou até 1.200 que, uma vez, tive de fazer. Cometi, junto com um colega, certo deslize – que atualmente poderia ser perfeitamente entendido – na aula de ciências. A punição me veio da direção da escola: 15 dias sem recreio e as 1.200 cópias da frase que ainda tenho de cor.

Da escola de décadas atrás, restam o prédio principal, suas salas e corredores do bloco central. Alguns objetos antigos já não estão no imóvel, tais como mobiliário, as carteiras para dois alunos e o relógio, que foi roubado. Duas coisas ainda resistem ao tempo: as escadarias de pedra, que por sorte ainda não foram arrancadas ou cobertas por outro piso, e os bebedouros.  Bebíamos água, que não era tratada, abrindo uma torneira para que o precioso líquido saísse por um orifício feito no cano. Cabe-nos agora, penso eu, quando faltam dois meses para a portentosa edificação completar um século de vida, recuperar o que temos na memória: fotografias, biografias de professores e alunos para que possamos celebrar, com grande festa, os 100 anos de vida dessa que foi a escola de quase todos os resende-costenses.

O Brasil que eu quero

17 de Outubro de 2018, por Edésio Lara 0

Alunas da E. M. Conjurados, na Praça Dr. Costa Pinto, centro de Resende Costa (Fotos Edésio Lara)

No último mês de setembro, dois atos de violência contra professores tomaram conta do noticiário e, rapidamente, circularam pelas redes sociais. Camanducaia/MG e Rio das Ostras/RJ tornaram-se centro das atenções devido às cenas grotescas e desrespeitosas cometidas por alunos contra dois professores de escolas públicas das cidades citadas. Agressões físicas, verbais, más condições de trabalho, salários ruins, mensagens preconceituosas e racistas formam um conjunto negativo de ações às quais se submetem muitos professores brasileiros.

Também, no mês passado, a TV Globo deu por encerrado o projeto lançado no início do ano, denominado “O Brasil que eu quero”. O projeto permitiu que brasileiros, em curto espaço de tempo, pudessem expressar suas opiniões e desejos para um país melhor. Corrupção, violência, educação e respeito às diferenças de raça e cor foram temas muito abordados pelos brasileiros que enviaram seus vídeos para serem exibidos durante os telejornais da emissora. Todos os participantes encaminharam recados diretos, duros para os políticos brasileiros que elegemos, pedindo o fim da corrupção, punição para os políticos e agentes públicos desonestos, saúde e educação de qualidade para o povo. Aproveito o momento e as duas situações citadas acima para dizer, aqui nesta coluna, do Brasil que eu quero.    

Moro ao lado da Escola Municipal Conjurados Resende Costa, que, a meu ver, pode servir de modelo para outras instituições de ensino brasileiras. Construída em 1963 e municipalizada em 1998, ela é espaçosa, limpa, bem conservada, oferece merenda escolar e transporte escolar gratuito para os alunos. Tem laboratório de informática, corpo docente qualificado e área de lazer de dar inveja. Na porta da escola, todos os dias, lá estão policiais militares para organizar o trânsito de veículos e dar segurança às crianças que chegam à escola ou saem dela.

Nessa escola, no último dia 28, anotei um bom exemplo. Para ilustrar um trabalho sobre folclore, a família de uma aluna convidou o Grupo de Congada Nossa Senhora do Rosário / São Cosme e Damião para uma apresentação. Fui até lá e vi toda a escola cheia de alegria assistindo ao grupo de congada.

Aqui reproduzo fotos que fiz. Uma foi na Escola Municipal Marcos de Oliveira Braga, do Distrito de Jacarandira, e a outra na sede do município. Em Jacarandira, os alunos, encantados e muito receptivos, receberam livros doados pela Associação dos Amigos da Cultura de Resende Costa/Amirco para a biblioteca da instituição. Na Praça Dr. Costa Pinto, no centro de Resende Costa, encontro-me sempre com um grupo de alunas da EM Conjurados Resende Costa. Semanalmente, elas se reúnem para conversar e ir a uma lanchonete. Semanas atrás minhas queridas vizinhas Lívia e Millena pediram-me que eu publicasse nessa coluna uma foto que tirei do grupo.  

Pois, a partir de situações singelas como essas, o que eu desejo para todos nesse mês em que festejamos o dia dos professores e das crianças é o direito de ir e vir com segurança, saúde, educação de qualidade e respeito.

Tchau, Bananera!

15 de Agosto de 2018, por Edésio Lara 0

Camilo Bananera (Foto redes sociais)

No penúltimo domingo de julho, perdemos um amigo. Camilo Lelis da Silva completaria 64 anos em 3 de agosto. Passou mal num dia, morreu no outro. Foi tudo tão rápido que muitos só tiveram notícia da sua morte depois do seu sepultamento. Camilo foi um dos sete filhos de Tomé e Eleonilda, a Nilda do Tomé. Era chamado por todos de Camilo do “Tumé” ou “Bananera” (bananeira). O apelido de “Bananera”, segundo o Lúcio (Fumega) foi-lhe dado em virtude da banana de São Tomé. A banana, associada ao nome do seu pai, lhe rendeu esse apelido, do qual o povo acabou retirando a letra “i”, ficando “Bananera”.

Figura simples e de memória privilegiada, apreciava música erudita (clássica) e poesia. Não por acaso, gostava de assoviar trechos de obras importantes, como a 9ª Sinfonia de Beethoven ou uma das Ave Marias que ouvimos todos os dias através dos alto-falantes da igreja Matriz: a de Arcadelt, Zimmerman ou Schubert. De vez em quando, lá vinha ele recitando, e de cor, trechos dos Lusíadas de Camões. Todos os dias, às 6h, saía de casa assoviando uma das músicas prediletas. Era como um sinal de vida; todos sabiam que ele estava por perto. Poucos anos atrás, aventurou-se na atividade de compositor e ganhou o primeiro lugar em concurso de marchinha carnavalesca promovido pela Amirco (Associação de Amigos da Cultura de Resende Costa).

Vestindo calção, camiseta e chinelos, de preferência, circulava pelo comércio da cidade prestando pequenos serviços a várias pessoas. Sair para fazer uma fezinha no jogo do bicho, pagar contas na casa lotérica, levar documentos de um lugar a outro, buscar ervas que considerava medicinais e doá-las aos conhecidos, catar minhoca para os amigos pescadores ou capinar uma horta de couve, eram ações corriqueiras desse resende-costense bem-humorado e prestativo. Era, também, considerado um homem de confiança, honesto.

De vez em quando, tomava umas e outras. Mas era disciplinado, costumava anunciar quando ia começar e parar de beber e quanto tempo seria seu período de abstinência. Eram dois ou três meses sem colocar uma gota de bebida alcoólica na boca para, depois, atravessar uma semana inteira “invernado na manguaça”, como é de costume dizer. Aos familiares que insistiam para que ele parasse de beber, ele respondia: Amanhã tô bão, amanhã eu paro.

Certa vez, o Pepe (da gráfica) o chamou para pescar umas piabas. Fazia muito frio, portanto resolveram levar uma garrafa de cachaça e outra de conhaque para tomarem uma dose quando tivessem de descer rio abaixo para pescar. Chegando ao pesqueiro, resolveram cada um tomar um rumo diferente. Passados alguns instantes, Pepe ouviu ao longe o Camilo cantando e assobiando. Logo “caiu a ficha” do Pepe, que voltou ao ponto onde haviam deixado a bebida e um tira-gosto. Bananera havia consumido quase tudo o que levaram e já estava pronto para retornar a Resende Costa. Queria dar continuidade em algum boteco ao que havia iniciado na pescaria.

Camilo me disse que tinha por prazer chupar balas deitado enquanto assistia televisão. Nesse mesmo dia, me prometeu uma muda de gabiroba. Não teve tempo para isso. Segundo sua irmã Fátima, no hospital pediu água mineral sem gás e sopa de fubá, para o dia seguinte. Trouxeram-lhe a água na caneca, mas recusou. Tem de ser na garrafinha, disse ele ao seu sobrinho Jardel. Água com gás ele tomava quando estava decidido a encerrar o período de bebedeira.

O pequeno João Pedro, filho da Zana cabeleireira, era mais um dos seus amigos. Ao ouvir o assobio, João Pedro corria para a porta de casa para receber uma bala de presente. Faz pouco tempo, o garoto, além da bala, resolveu pedir ao amigo uns trocados. Bananera caiu na gargalhada e disse: Que isso, João Pode (como ele o chamava), quem precisa de dinheiro aqui sou eu.

João Pedro, após a morte do amigo, na sua pura inocência e com o olhar fixo no quadro da Divina Providência afixado na parede da sua casa, perguntou à sua mãe se tinha um “jeito de ir lá no Céu para se encontrar com o amigo e matar a saudade”.

O último dinheiro que o Camilo recebeu por um serviço prestado, ele resolveu distribuir para os amigos no bar do Dão. Sua irmã Fátima disse que a Rosa da Cezinha recusou os cinquenta reais que ele lhe ofereceu. Ele era assim: simples, alegre e desapegado de bens materiais. Quem não se lembra dele nos carnavais, fantasiado de palhaço e girando um prato esmaltado na ponta de uma vara?