A Europa vai às eleições parlamentares numa encruzilhada, denominada “ameaça existencial” pela especialista em assuntos internacionais, a professora Diana Soller, em comentário na CNN Portugal. Para além do empenho dos Estados Unidos em “serenar os ânimos” neste ambiente assumidamente de “pré-guerra”, a Europa tenta preparar-se para o futuro, para muitos nem tão distante, de uma inevitável guerra contra o instinto imperialista da Rússia. Líderes políticos e militares, principalmente do norte, já advertem abertamente que a Europa se deve preparar para um conflito continental nos próximos três ou quatro anos. É sempre bom lembrar que a Europa já foi palco de duas guerras mundiais, ainda que o inimigo tenha sido outro.
É nesse clima meio sombrio, frente às últimas reações à invasão da Ucrânia, que a União Europeia vai às urnas. E assuntos espinhosos, da maior importância, estarão sobre a mesa, aguardando a manifetação dos eleitos. São decisões que ganharão um tom dramático, principalmente porque os analistas prevêem um Parlamento Europeu (poder legislativo da União Europeia) mais conservador, com grande peso da direita radical. Pelo menos em Portugal (não deve ser muito diferente nos outros países), a campanha para as eleições europeias acabou contaminada por assuntos locais; até parece que os candidatos vivem outra realidade.
De qualquer forma, vão ter de decidir sobre questões vitais para o futuro da Europa. Entre estes temas polêmicos, está o alargamento da União Europeia, para incluir a Ucrânia (processo iniciado recentemente) e outros países candidatos do leste (Albânia, Bósnia-Herzegovina, Macedônia do Norte, Montenegro, Sérvia, Turquia, Ucrânia, Moldova e Geórgia) que aguardam há mais tempo; processo este que, para alguns, deve ser acelerado por conta da ameaça russa, mas há resistências por parte de países que temem a concorrência na divisão do bolo dos fundos europeus.
Outro tema divisivo é a questão da imigração. Na medida em que os partidos de direita ganham espaço a cada eleição, as reações aos imigrantes são mais estridentes e, em geral, embricadas com racismo e xenofobia (aversão a estrangeiros). Há países como a Hungria que se recusam a receber imigrantes, mesmo com o encolhimento da população; há países como a Polônia que preferem receber imigrantes como os ucranianos (eslavos); e mesmo em países como Portugal, que recebe milhares de imigrantes lusófonos e asiáticos, o discurso de ódio começa a ganhar espaço. O que se percebe é uma pressão para o fechamento das fronteiras, dificultando cada vez mais a entrada de “estrangeiros”, o que é incoerente com uma população tendencialmente envelhecida.
Um terceiro tema é a política de transição energética para combater o impacto das mudanças climáticas. Aqui há problemas de várias naturezas, desde as importações baratas (subvalorizadas) de carros elétricos e equipamentos de energia solar e eólica da China (há pressões no sentido de taxar com imposto esses bens, ou subsidiar os locais, para proteger e incentivar a indústria), passando pela falta de integração efetiva do sistema ferroviário (para concorrer com o transporte aéreo e rodoviário) e até mesmo a adoção de medidas conjuntas para financiar o projeto energético europeu (como ocorreu com a compra de vacinas na pandemia ou o financiamento comum a longo prazo do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).
Os investimentos em defesa, perante a crescente ameaça russa, são outro desafio para os novos eleitos. Já se discute a volta ou o alargamento do serviço militar obrigatório (alguns países já o adotam e querem incluir as mulheres). Há os que defendem um complexo industrial militar moderno na Europa, que inclua a experiência ucraniana no campo de batalha unindo tecnologia avançada e drones inteligentes. E há quem simplesmente defenda que se deva continuar importando armas e equipamentos a preços mais acessíveis. Uma discussão entre dependência e autonomia, que se agrava na medida em que incomoda a muitos o futuro incerto das relações com os Estados Unidos. Embora os norte-americanos queiram preservar a ordem liberal através de alianças militares na Europa e na Ásia, para fazer frente à ordem iliberal centrada na China, como disse a revista The Economist (11/05/2024).
Há outros temas como as questões da saúde e da habitação que perpassam o continente.
Sobre o Parlamento Europeu
O Parlamento Europeu é composto por 705 eurodeputados, o que o torna o segundo maior eleitorado de uma democracia (depois da Índia), com cerca de 400 milhões de eleitores. Juntamente com o Conselho da União Europeia (representantes dos governos nacionais) aprova a legislação europeia, normalmente sob proposta Comissão Europeia.
Os eurodeputados, eleitos pelos cidadãos europeus para mandato de cinco anos, representam os países-membros, de acordo com o contingente populacional. A Alemanha tem o maior número de parlamentares (96 ou 13,62%), seguida de França (79 ou 11,21%) e Itália (76 ou 10,78%). Portugal faz parte do grupo com 21 eurodeputados cada (2,98%) ao lado de países como Suécia e Hungria. Com menor número de deputados (6 ou 0,85%) aparecem Chipre, Luxemburgo e Malta.
O Parlamento Europeu, que se reúne em Estrasburgo (França), é composto por sete famílias políticas das quais as principais são o Partido Popular Europeu (PPE) e os Socialistas e Democratas (S&D). Os grupos da direita radical, como a Identidade e Democracia (ID), devem ganhar terreno na próxima composição do Parlamento.
“O processo legislativo ordinário confere o mesmo peso ao Parlamento Europeu e ao Conselho da União Europeia num vasto leque de domínios como, por exemplo: governação econômica, imigração, energia, transportes, ambiente, proteção do(a)s consumidore(a)s, entre outros. A grande maioria das leis europeias é adotada conjuntamente pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho.
“O processo de codecisão foi introduzido pelo Tratado de Maastricht sobre a União Europeia (1992) e depois ampliado e adaptado para reforçar a sua eficácia pelo Tratado de Amesterdão (1999). Com o Tratado de Lisboa, que entrou em vigor em 1 de dezembro de 2009, passou a chamar-se processo legislativo ordinário e tornou-se o principal processo legislativo do sistema deliberativo.
“Agora (o Parlamento Europeu) pode colegislar em pé de igualdade com o Conselho na grande maioria dos domínios (…), e a consulta tornou-se um processo legislativo especial (ou, mesmo, um processo não legislativo), usado num número limitado de casos.
“Este processo passou a aplicar-se a um número limitado de domínios legislativos, como as isenções no âmbito do mercado interno e o direito da concorrência.
Clique aqui para mais informações sobre o Parlamento Europeu
Fonte complementar: Wikipédia