Na última coluna, confessei-me otimista frente à vida. E continuo assim, apesar da presença, no cenário nacional, de um déspota cruel, que adora colocar os outros em um clima de medo e que, com sua incapacidade de diálogo, insensibilidade afetiva, isolamento espiritual, nos dá o direito de o vermos como um autêntico paciente psiquiátrico. Gigante que seja em seu gueto narcisístico, não o considero maior que um enorme número de brasileiros que, no seu dia a dia, me levam a acreditar na nossa gente.
Acredito na humanidade e, especificamente, na nossa gente brasileira, porque presencio cenas encantadoras, manifestação que são de confiança, de compreensão, de oferta e recebimento de carinho e atenção. As cenas que me levam a tal crença se sucedem, ininterruptamente.
Vejo gente que cede a preferência em tantas circunstâncias, mesmo sabendo de seus direitos. Vejo gente a pedir “licença”, gente que agradece “uma prioridade” que lhe foi oferecida, gente que retribui uma saudação recebida, que cumprimenta outrem por um êxito alcançado, por uma boa ação feita.
Como é bonito ouvir um “muito obrigado”. Como é sublime saber de gente que não se ofende, ainda que tenha sido ofendida; gente que se recusa a sentir ódio por ter sido negligenciada.
É-me extremamente consolador saber que, apesar de todos os acidentes que ocorrem no trânsito, a maioria esmagadora das pessoas se comporta bem, com respeito às pessoas e às leis.
Ah! Fico encantado com tais comportamentos. São a expressão clara de que, entre os humanos, não há maiores nem menores. São atitudes de pessoas sensíveis que acreditam na sensibilidade de seus interlocutores. Essa gente me leva a dizer que, enquanto houver manifestações de atenção, de cuidado, como as exemplificadas, continuarei acreditando na nossa gente e até na humanidade.
Só quem está isolado no mundo não percebe a vida que vibra nas atitudes geradoras de interação entre as pessoas. Só quem se basta não se dá conta de que a vida é possível, a alegria pode clarear o caminhar, a esperança pode alimentar a jornada e a travessia. Só quem está só é que não se dá conta de que a gente se torna aquilo de que participa; a gente se faz naquilo para o que se olha. Só quem está só não tem disposição para se encantar com as pequenas coisas, com as atitudes simples, com os olhares enternecedores, com as mãos amorosas, com as palavras emocionadas, com as companhias enriquecedoras. Que grandeza humana ouvir: “obrigado por me agradecer”. Tradução: não sou o centro, não sou maior, não sou melhor. Sou um como você, sou um com você.
Sinto grande vergonha por não conseguir ver esses sentimentos na maioria de nossos representantes públicos e na quase totalidade dos componentes do supremo órgão judiciário do país. Mas esses não constituem a esmagadora maioria de nossa gente.
“Fica sempre um pouco de perfume nas mãos que oferecem rosas”, por isso procuro cultivá-las.
Sou um crente inveterado.