A maior facada na Amazônia: o Projeto de Lei 490/2007
15 de Julho de 2021, por Instituto Rio Santo Antônio 0

Mapa que mostra a estatística brutal do desmatamento no Brasil
No dia 24 de junho, foi publicado em uma manchete do jornal El País: “Congresso decide extinguir a Amazônia: no dia em que o antiministro Ricardo Salles deixou o Governo Bolsonaro, foi desfechado o mais terrível ataque à maior floresta tropical do mundo”. Infelizmente, é isso mesmo que está ocorrendo. O governo Bolsonaro e seus aliados, imbuídos de um suposto projeto de modernidade e de progresso para a região da Floresta Amazônica, estão destruindo a maior floresta tropical do planeta e toda vida nativa local, inclusive humana. Nos termos do artigo: “O PL 490 é a maior ofensiva contra a Amazônia e seus povos (...). Como a maior floresta tropical do mundo é a grande reguladora do clima, o que acontece neste momento no Congresso brasileiro ameaça o planeta.”
Enquanto na imprensa e nas redes sociais as falas eram sobre Covid-19, CPI, compra de vacina e, até mesmo, noticiando a feliz saída do Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJC) da Câmara dos Deputados aprovou, por 40 a 21 votos, o Projeto de Lei 490/2007. Anteriormente, em 2009, o mesmo havia sido rejeitado pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias. No entanto, apesar da oposição de vários deputados, o Projeto prosseguiu para a CCJC, sendo colocado em apreciação em maio e aprovado no dia 23 de junho. Isso era o que faltava em seu prosseguimento para ser votado no Congresso Nacional, primeiro na Câmara dos Deputados e depois, no Senado. E agora, se aprovado, se tornará de fato uma lei.
O projeto prevê alterações na utilização das terras indígenas. Destaca-se que, desde a Constituição Federal de 1967, na época da Ditadura Militar, ficou garantida aos índios a posse permanente das terras que ocupavam. Esse fato foi regulamentado pela Lei Federal 6.001/1973, o Estatuto do Índio, com o propósito de se preservarem a cultura e as terras indígenas. Tais posturas foram recepcionadas pela Constituição de 1988 em seu artigo 231: “São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.” Dessa forma, o Projeto de Lei 490/2007 pretende alterar o Estatuto, ao possibilitar a legalização de atividades econômicas predatórias em áreas indígenas; permitir a retirada da posse de terras já identificadas (isto é, só serão consideras as terras que estavam comprovadamente na posse indígena antes de 1988), flexibilizar o contato com as tribos mais isoladas e dificultar as demarcações de novas áreas.
Creio que todos devem saber da importância da Amazônia, nada menos do que a maior floresta equatorial do planeta, e, segundo alguns especialistas, um grande regulador do clima mundial. Pesquisas já afirmam que a floresta, o maior sequestrador de carbono do planeta, está emitindo mais carbono do que retém, visto que já perdeu algo em torno de 20% de sua área. De acordo com o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia, quando o desmatamento atinge entre 20% e 25% do bioma, o prejuízo à floresta se torna irreversível. Citando novamente o artigo: “Isso significa que a Amazônia começa a deixar de ser solução para se tornar um problema.”
Convém destacar a importância e a abrangência das áreas protegidas por lei (terras indígenas, Unidades de Conservação e áreas militares), que representam cerca de 43,9% da Amazônia, segundo o IMAZON. As terras indígenas homologadas, declaradas ou identificadas são 21,7% dessas áreas protegidas, daí percebemos sua importância.
A situação atual é tão grave que, pela primeira vez na história do país, uma entidade (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) pretende denunciar o presidente por genocídio e ecocídio no Tribunal Penal Internacional, visto que há um claro descumprimento da Constituição Federal. Qualquer brasileiro, que possua um mínimo de sanidade ética e intelectual, pode perceber que o ataque às terras indígenas, além de representar uma afronta à dignidade humana, é mais uma facada que contribui para a morte lenta e gradual da Amazônia. Por fim, mesmo com todo o conhecimento científico atual, como explicaremos para a geração futura que deixamos a floresta sucumbir?
A pressão sobre o que ainda resta dos biomas brasileiros
16 de Junho de 2021, por Instituto Rio Santo Antônio 0

Mapa dos biomas do Brasil
Lucas Matoso Alves1
Adriano Valério Resende2
É notório que o Brasil tem a maior biodiversidade do planeta. Para se ter uma ideia de como somos importantes: abrigamos pouco mais de 20% da variedade de fauna e flora existentes, temos 12% da disponibilidade de água doce superficial, dois dos maiores aquíferos do planeta e a maior floresta equatorial úmida. Devido à dimensão do país e por se estender por zonas climáticas distintas, há uma significativa variação ecológica ao longo do território, o que gera uma elevada biodiversidade. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), temos seis biomas, que, devido ao processo histórico de ocupação do país, já sofreram significativas intervenções. E, recentemente, a degradação desses biomas se acelerou devido à política ambiental do atual governo.
Bioma é o conjunto de comunidades vegetais e animais determinado por fatores geográficos e que ocupa grandes extensões. Dos biomas brasileiros, dois são constituídos por florestas: Amazônia e Mata Atlântica; dois são de savanas: Caatinga e Cerrado; um é de vegetação rasteira, o Pampa; e o Complexo do Pantanal.
A Amazônia é a maior floresta equatorial do mundo, ocupando uma área de 6,9 milhões de km². Desses, 4,2 milhões de Km² estão no Brasil, o que corresponde a quase metade do território nacional, abrangendo nove estados. Mesmo sendo um dos biomas brasileiros mais preservados, cerca de 25% de seu território já foi alterado. Atualmente, a região sofre os efeitos da expansão da fronteira agrícola. Os principais problemas ambientais enfrentados são: desmatamento, queimadas, garimpo, agropastoreio, biopirataria e as intervenções ilegais em unidades de conservação e em terras indígenas.
A Mata Atlântica ocupava todo o litoral, indo do Rio Grande do Norte ao do Sul. Trata-se de mata tropical, originada pela umidade proveniente do oceano e, proporcionalmente, apresenta a maior diversidade biológica do país. É o ambiente nativo da árvore pau-brasil, que cedeu o nome ao nosso país. Devido à ocupação antrópica, resta menos de 13% de sua cobertura original, sendo o segundo ecossistema mais ameaçado do mundo.
A Caatinga (“floresta branca”) ocupa o interior do Nordeste e um pedaço do norte de Minas, equivalendo a 11% do território nacional. O bioma é o único inteiramente brasileiro. O destaque é para a diversidade da fauna. Por exemplo, ele abriga 221 espécies de abelhas. O desmatamento tem acontecido de forma acelerada, chegando a comprometer quase metade do bioma.
O Cerrado é o segundo maior bioma da América do Sul e ocupa 22% do território brasileiro, em sua parte central. O realce é para o potencial de água superficial e subterrânea, sendo chamado de “caixa d’água do Brasil”. Devido a vários fatores, é a área de maior produção agropecuária do país e atualmente também sofre a pressão da expansão da fronteira agrícola. O bioma já perdeu em torno de 45% de sua vegetação nativa. Por isso, o Cerrado e a Mata Atlântica estão na lista mundial de hotspots, ou seja, áreas com grande diversidade e ameaçadas de extinção.
O Pampa (significa “região plana”) está restrito ao Rio Grande do Sul e se caracteriza pelo predomínio dos campos nativos. Essa área até hoje é muito utilizada para a pecuária. Restam por volta de 35% da vegetação nativa original.
O Pantanal é considerado uma das maiores áreas úmidas contínuas do mundo. O destaque é para sua beleza natural, apesar de ser o menor bioma brasileiro. Ainda mantém 83% de sua área com cobertura vegetal nativa.
Cabe destacar que Minas Gerais engloba três biomas: Mata Atlântica (a leste), Cerrado (a oeste) e um pedaço de Caatinga, no extremo norte. Resende Costa está dentro do primeiro. Para se ter uma ideia do grau de intervenção, segundo dados do Inventário Florestal divulgado pela UFLA em 2008, o município conservava apenas 7,45% de sua vegetação nativa.
Desde 2005, segundo o IBGE, ocorreu uma desaceleração no desmatamento. Mesmo assim, entre 2000 e 2018 houve perda da vegetação nativa dos biomas brasileiros de cerca de 500 mil km². As maiores áreas foram na Amazônia e no Cerrado. Nesse período, os biomas brasileiros perderam 8,34% de sua área. Infelizmente, a partir de 2019, voltamos a conviver com altas taxas de desmatamento, isso devido a mudanças na legislação ambiental, nos procedimentos de licenciamento e na política interna da região, o que tem pressionado ainda mais a expansão para áreas preservadas. Essas questões serão ainda discutidas em nossa coluna.
1 - Aluno do Curso Técnico de Meio Ambiente – CEFET/MG
2 - Professor CEFET/MG
O descrédito do Brasil na Cúpula do Clima de 2021
19 de Maio de 2021, por Instituto Rio Santo Antônio 0
Nos dias 22 e 23 de abril, foi realizada a Cúpula de Líderes sobre o Clima. O encontro, que foi virtual devido à pandemia da Covid-19, reuniu líderes dos quarenta países mais importantes, por solicitação do presidente estadunidense Joe Biden. O objetivo foi reafirmar os compromissos ambientais, especialmente sobre a questão da redução das emissões de gases causadores do aquecimento global. Bolsonaro foi o décimo nono líder a discursar no primeiro dia do evento.
A realização da Cúpula do Clima de 2021, a pedido de Biden, foi uma estratégia para que os EUA resgatem seu protagonismo na discussão climática global, perdida na era Trump. Dentre outros fatos assumidos pelo ex-presidente, citamos a saída do país do Acordo de Paris, substituto do Protocolo de Kyoto. O Acordo foi assinado em dezembro de 2015, sendo reconhecido praticamente por todos os países, e estabeleceu metas para a redução da emissão de gases estufa. Destaca-se que China, EUA, Índia, Rússia e Brasil são os maiores geradores desses gases.
A Cúpula do Clima é uma espécie de reunião não oficial (não está dentro do calendário da ONU) e preparatória para a chamada COP 26. As Conferências das Partes (COP) são eventos organizados no âmbito da Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU. A COP 26 acontecerá na cidade de Glasgow (Escócia), em novembro deste ano, sob a presidência do Reino Unido. Ela aconteceria em novembro de 2020, mas foi adiada em um ano devido à pandemia. Na Conferência, os países que assinaram o Acordo de Paris apresentam seu desempenho no cumprimento das metas assumidas e revisam ou ratificam os próximos passos e as estratégias para efetivar as mudanças no padrão ambiental. Daí a importância das discussões prévias no âmbito de eventos como a Cúpula do Clima.
Na solenidade de abertura da Cúpula, líderes de vários países discursaram sobre as ações realizadas e ainda a se realizarem em relação à emissão de gases que provocam o efeito estufa antrópico. Uma das falas mais esperadas na Cúpula foi a do presidente do Brasil, Jair Messias Bolsonaro. Ele falou por mais de três minutos e, segundo a imprensa, assumiu um tom “moderado” em relação às questões ambientais. Os pontos principais de sua fala foram: eliminar o desmatamento ilegal na Amazônia até 2030 e zerar o balanço das emissões de gás carbônico, alcançando a neutralidade climática até 2050. Nas palavras do presidente: “Entre as medidas necessárias para tanto, destaco aqui o compromisso de eliminar o desmatamento ilegal até 2030, com a plena e pronta aplicação do nosso Código Florestal. Com isso reduziremos em quase 50% nossas emissões até essa data.”
Mesmo com um discurso moderado e prometendo ações mais efetivas em prol da preservação ambiental, “o Brasil sai do encontro da mesma forma como entrou: em descrédito com a comunidade internacional.” Na verdade, o que temos presenciado são tentativas (ou melhor, a concretização) do desmonte da fiscalização, da legislação ambiental e do Fundo Amazônia. Assim, o que ficou evidente foi a divergência entre o discurso do presidente e o que realmente está acontecendo na prática. Vejamos alguns fatos principais veiculados na imprensa.
Diante da promessa do aumento de recursos para a fiscalização, cita-se que a previsão orçamentária para o Ministério do Meio Ambiente é a menor das últimas duas décadas. As demissões de funcionários de seus cargos de chefias por não se alinharem com a política bolsonarista. O desmatamento ilegal na Amazônia aumentou desde que Bolsonaro assumiu o cargo em 2019. O Brasil é o maior emissor de gases estufa advindos de queimadas. O Fundo Amazônia, financiado principalmente pela Noruega e pela Alemanha, está desativado devido a questões políticas/burocráticas realizadas pelo governo, mas possui um valor em caixa de quase 3 bilhões esperando a resolução dos impasses. Na Cúpula, o presidente recuou quanto à sua postura e pediu apoio financeiro internacional para a Amazônia, mas não tocou na questão do Fundo.
Por fim, na realidade, para além das questões ambientais, o que estamos vivenciando é o desmonte das instituições brasileiras e das premissas do Estado Democrático de Direito. Nesse sentido, assim como precisamos lutar pela preservação da Amazônia, temos que zelar pela democracia brasileira.
A água e sua gestão
14 de Abril de 2021, por Instituto Rio Santo Antônio 0
A água é o bem mineral mais importante para o ser humano. Ela é fundamental para toda a vida animal e vegetal do planeta. No dia 22 de março é celebrado o seu Dia Mundial. Neste ano, por causa da pandemia, não tivemos encontros nem ações para comemorá-lo. No entanto, aconteceram diversos eventos virtuais sobre o assunto, sendo várias temáticas debatidas, dentre elas: chuvas, qualidade de água, nível dos reservatórios, esgotamento sanitário, gestão, políticas públicas, degradação ambiental. Vamos tratar aqui de uma questão muito importante, mas, infelizmente, ainda pouco conhecida pela sociedade: planejamento e gestão da água enquanto recurso socioeconômico.
Historicamente, a Constituição Federal de 1988 foi um marco no que tange aos recursos hídricos, ou seja, a água deixou de ser de domínio privado para ser pública, de dominialidade da União ou do Estado. Assim, para utilizá-la, devemos ter autorização da Agência Nacional de Águas (ANA) ou do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM), mesmo que ela provenha de nossa propriedade. Cabe destacar que não existe recurso hídrico que pertença aos municípios.
Para regulamentar a gestão dos recursos hídricos, prevista na Constituição, a União e os Estados promulgaram leis específicas visando à implementação das Políticas Nacional e Estaduais de Recursos Hídricos. A chamada Lei das Águas (Lei Federal 9.433/97), de inspiração francesa, estabeleceu que o planejamento e a gestão devem acontecer de forma regional, isto é, por bacias hidrográficas. Para isso, dentro de cada uma dessas unidades de gestão foram criados os Comitês de Bacia Hidrográfica (CBHs), um fórum democrático e permanente de debate e de negociação, o “parlamento das águas”.
Na composição de um CBH devem estar presentes representantes do poder público (municipal, estadual e federal), dos usuários de água (que possuem Outorga) e da sociedade civil organizada. Ressalta-se que, como o município de Resende Costa é drenado por três bacias (dos rios Pará, Paraopeba e das Mortes), é área de atuação de três comitês estaduais (CBHs Pará, Paraopeba e Vertentes do Rio Grande) e dois federais (rios São Francisco e Grande). A Prefeitura Municipal já participou dos CBHs estaduais Pará e Vertentes do Rio Grande. Já o IRIS (Instituto Rio Santo Antônio) representa Resende Costa no CBH Vertentes do Rio Grande desde 2011 e a nossa região no CBH Grande desde 2016.
Para implementação da Política de Recursos Hídricos, a Lei das Águas estabeleceu alguns instrumentos de gestão. Dentre os principais, o primeiro são os Planos Diretores, que contemplam os estudos das bacias hidrográficas com as propostas técnicas para intervenção (Planos de Ações). Segundo: enquadramento dos corpos de água em classes, o que estabelece o padrão de qualidade das águas. Terceiro: Outorgas, as autorizações legais para intervenção nos recursos hídricos. O quarto é a cobrança pela utilização da água. O quinto é o Sistema de Informações, que são os canais de comunicação. Esses instrumentos de gestão, apesar dos percalços, estão sendo executados em Minas Gerais sob a coordenação do IGAM. Especificamente na bacia do Rio Grande, ainda não foi implantada a cobrança pela utilização da água.
Segundo a Lei Estadual nº 13.199/1999, sujeita-se à cobrança pelo uso da água aquele que utilizar, consumir ou poluir recursos hídricos. A cobrança será feita inicialmente pelo Estado, através do IGAM, e depois diretamente pelos CBHs. A função da cobrança é manter a estrutura administrativa e operacional dos comitês (7,5% do valor arrecadado) e financiar os projetos socioambientais previstos no Plano Diretor. Por exemplo, a área de atuação do CBH Vertentes é de 42 municípios, totalizando quase 600 mil habitantes. A previsão de arrecadação na bacia é de um pouco mais de um milhão de reais por ano, sendo o setor de saneamento (captação de água e esgotamento sanitário) responsável por quase 80% desse valor. Destaca-se que para a vertente mineira do rio Grande, composta por oito comitês, a previsão é de sete milhões.
No último dia 23 de março, foram publicadas as regras para a cobrança em Minas Gerais, por meio do Decreto 48.160/2021. Nesse sentido, está posto o novo desafio para os gestores das águas da bacia do rio Grande: gerenciar os recursos que serão arrecadados visando à melhoria da qualidade socioambiental da nossa região.
Aumento no uso de agrotóxicos no Brasil
17 de Marco de 2021, por Instituto Rio Santo Antônio 0
Giovanna dos Santos Leal*
Adriano Valério Resende**
Infelizmente, não faltam evidências de que o uso de agrotóxicos em solo brasileiro é crescente. Pelas informações da UM Contrade (United Nations Commodity Trade Statistics Database), a partir dos anos 2000 o Brasil obteve um acréscimo de 760% nas importações de agroquímicos, o que garantiu ao país o status de maior consumidor mundialdesde 2008. No período de 2007 a 2013, segundo o Greenpeace, a utilização de pesticidas duplicou, ao passo que a área cultivada aumentou apenas 20%. De 2017 em diante, conforme a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), a liberação de agrotóxicos, em território nacional, foi superior a 400 produtos por ano. Segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA), junto à consultoria Phillips McDougall, só em 2013 o país gastou US$10 bilhões em agrotóxicos.
A história do surgimento dos agroquímicos e do crescimento tão vertiginoso de sua utilização está atrelada às relações capitalistas de produção e à Segunda Guerra Mundial, quando se percebeu que determinadas substâncias criadas em laboratório para fins bélicos eram letais aos insetos. No Brasil, eles foram incorporados no contexto da Revolução Verde, especialmente a partir da década de 70, com a suposta finalidade de erradicar a fome, contando com o apoio financeiro do governo federal, por intermédio de isenção fiscal na instalação de unidades fabris e de promoção de linhas de crédito rural.
O nobre objetivo serviu de máscara ao real propósito da empreitada capitalista, que pretendia transformar a produção de alimentos em lucro para mega empresas. Nessa lógica, os agrotóxicos são responsáveis, no panorama do agronegócio, pela maior parte da receita de empresas como a Monsanto e a Syngenta, reforçando, assim, a ideia de que o benefício financeiro da indústria agroquímica foi sobreposto à segurança alimentar da população.
Hodiernamente, é impossível não estar em contato com esses venenos, seja através da alimentação ou de formas mais diretas, na sua utilização. Logo, ainda que o modelo de agricultura baseado na Revolução Verde tenha ampliado a capacidade de produção, ele gerou impactos socioambientais preocupantes que se estendem da poluição ambiental, perda de biodiversidade e contaminação de trabalhadores até intoxicações crônicas.
Conforme informações da literatura especializada sobre o tema, dos agrotóxicos pulverizados, menos de 10% alcançam seu alvo, sendo que grande parte é levada das folhas das plantas por meio da atividade pluvial ou da irrigação. Devido às suas propriedades bioacumulativas, restos de alguns desses agentes químicos acumulam-se no corpo de aves, peixes e toda a sorte de animais. Por isso, pesquisadores, que realizam testes em animais, julgam quase impossível encontrar espécimes que não estejam contaminadas.
Mesmo após provas científicas dos danos à saúde do ser humano e da natureza, os agrotóxicos banidos em outros países permanecem sendo comercializados no Brasil. A exposição ao Glifosato, por exemplo, utilizado intensamente no país, pode causar convulsões, vômitos, danos ao fígado, doenças de pele, câncer, entre vários outros problemas.
Na contramão do que acontece no Brasil, o Butão, pequeno país localizado na Ásia, aderiu a um novo indicador social denominado Felicidade Interna Bruta (FIB). Esse índice tem como princípios a conservação do ambiente natural, a sustentabilidade, a boa governança e o fomento aos valores culturais. A fim de cumprir com essas premissas, a nação deseja permitir apenas agricultura orgânica, na qual os agroquímicos são terminantemente proibidos.
Por fim, na tentativa de fugir de sua responsabilidade e de continuar obtendo lucros massivos às custas de prejuízos à natureza e à saúde do corpo social, a bilionária indústria do agronegócio e a mídia procuram culpabilizar os trabalhadores rurais pelos casos de contaminação, afirmando que o maior problema dos agrotóxicos consiste no seu uso inadequado por parte dos pequenos agricultores. À vista disso, é necessário que movimentos como a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida sejam apoiados e os movimentos sociais de base sejam fortalecidos para que se possa romper os abusos de um modelo exploratório e insustentável de produção agrícola.
*Aluna do Curso Técnico de Meio Ambiente – CEFET/MG
**Professor - CEFET/MG