o que pode haver em comum na biografia dos brasileiros Orlando Drummond, Dercy Gonçalves e Oscar Niemeyer? Além da fama que conquistaram pela profissão que abraçaram, os três ultrapassaram a marca dos 100 anos de vida. Orlando, mais conhecido pelo personagem “Seu Peru”, da Escolinha do Professor Raimundo, era ator, comediante, dublador e radialista. E morreu em 2021, aos 101 anos. Essa foi também a idade alcançada pela irreverente atriz, humorista, cantora, autora, diretora e produtora teatral Dercy Gonçalves, que faleceu em 2008. O genial arquiteto e urbanista Niemeyer, notável cidadão de renome internacional, viveu mais, até 2012, tendo partido em 5 de dezembro, dez dias antes de se completarem seus 105 anos.
Recentemente, em junho deste 2024, morreu aos 101 anos Celeste Arantes, mineira de Três Corações e mãe de Pelé. O “Rei” chegou a comemorar o centenário de vida dela em novembro de 2022, um mês antes do seu próprio falecimento.
Igualmente em junho último, mas celebrando sua existência e esbanjando simpatia e vitalidade, Beita de Souza Pereira posou sorridente para a câmera do celular do filho. “Minha mãe com 102 anos”, escreveu o cantor Ney Matogrosso na legenda da foto, ao usar as redes sociais na madrugada daquele dia 19 para compartilhar com seus seguidores uma imagem inédita de Dona Beita. Também viva e agora centenária, a psicanalista Suzane Bial nasceu em 3 de julho de 1924 em Berlim, Alemanha. Sim, o sobrenome a identifica corretamente como mãe do jornalista Pedro Bial.
Com tudo isso, um fato é inegável: as pessoas estão vivendo mais tempo. De acordo com os dados mais recentes (Censo de 2022) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a expectativa de vida do brasileiro é de, aproximadamente, 75,5 anos, um aumento de cerca de 35 anos desde os anos 1940.
Sobre a média de anos vividos algumas décadas atrás pela nossa população, uma notícia (de 4 de agosto de 1960) trazida do passado e postada pelo advogado Pedro Lindoso deu o que falar na internet, viralizou. O caso: durante uma leitura rotineira de edições antigas do Jornal do Commercio (de Manaus e em atividade desde 1904), Lindoso, de cara, teve a atenção despertada pelo título da matéria: “Ônibus entrou na casa humilde e foi apanhar a velhinha de 42 anos”. Se considerarmos que em 1960, data desse episódio, a expectativa de vida no Brasil era de 45 anos, Maria Oliveira, a mulher em questão, com seus 42 janeiros, era praticamente uma “velhinha” para os padrões da época, algo completamente impensável nos dias de hoje.
Vejamos o agora por mais um exemplo de boa longevidade. Ao celebrar o Dia Internacional da Mulher Negra Latino-Americana e Caribenha (25 de julho), o tradicional programa de entrevistas Sem Censura, do Canal Brasil, recebeu a militante Maria Soares. Feliz, lúcida, articulada e inteligente, Dona Santinha, assim também chamada e do alto dos seus produtivos 100 anos, deu uma verdadeira aula de cidadania com sua fala de peso e um histórico de lutas em defesa de causas contra o racismo e o machismo, entre outras.
Não vamos romantizar aqui o que se sabe ser difícil, ou seja, o processo do envelhecimento humano, o próprio envelhecimento e, principalmente, o prolongamento natural, óbvio, da vida de alguém até os 100 ou mais anos. Viver tanto, em condições satisfatórias, contudo, não deixa de ser uma façanha. Mulheres, muito mais, e homens centenários estão aí, não necessariamente desmemoriados ou “vivendo” a qualquer custo. Há que se ter muito respeito por eles. Estatisticamente, o Brasil tem mais de 37 mil indivíduos centenários.
Em Resende Costa, são pessoas como a Ninica, (mãe da Maria das Dores do Lico), 100 anos completados em 12 de fevereiro último. E Cecília Ramos de Oliveira, já retratada aqui no JL (pelo colega Edésio na edição de outubro de 2022), com seus quase 102 anos. Deve haver outras.
Admiráveis são essas vidas centenárias e todas as histórias construídas dentro delas ao longo de tantos e tantos anos.