Novembro – Finados
17 de Novembro de 2021, por João Magalhães 0
Não ouso afirmar que seja universal, mas a História mostra que uma grande maioria dos povos cultua seus mortos. Cemitérios, arte funerária, monumentos, estátuas, ritos religiosos, relíquias, amuletos etc. são a prova.
O mês de novembro caracteriza-se por Finados. De finar. Aqueles cuja vida biológica chegou ao fim, naturalmente ou provocada. Para a teologia cristã, a morte não existe para vida humana, pois ela não tem fim. Apenas transforma-se (“Vita mutatur, non tolitur”: a vida não é tirada, {apenas} muda-se). Até a morte do corpo é provisória, pois a ressurreição é dogma de fé.
Quando estas linhas chegarem ao leitor, a data apropriada já terá passado (o feriado de 2 de novembro), mas, na minha opinião, uma meditação, no sentido de se fazer um ditado a si mesmo (me ditare) sobre a vida e sua finitude e também sobre as vidas que já se foram, é sempre recomendável.
O culto aos mortos é sobretudo um culto à vida. À vida que tiveram. Vidas idas que fazem falta a nós que continuamos vivos. De modo especial, acho eu, merece um culto mais intenso, mais dedicado, a vida dos humanistas. Pessoas que puseram sua existência a serviço da vida. Pessoas que sempre colocaram em primeiro lugar o ser humano. Pessoas que perderam até a própria vida para salvar a dos outros.
Agora, inesperadamente, chegou mais uma peste, a da COVID-19, dentre as muitas que já assolaram a humanidade. Cabe uma reverência profunda às vítimas fatais e uma solidariedade afetuosa e prática ao sofrimento de seus familiares. Mas urge também um lamento indignado e uma luta renhida contra as forças do mal que rapinaram muitas vidas por omissão, interesses escusos, negacionismo, ignorância culpada, egoísmo e outros mais. Pessoa cujas vidas seriam salvas se tivessem sido adequadamente cuidadas!
Há que se lutar pela vida de todos os entes e barrar seus destrutores: os vírus, bactérias, fungos... E, de modo especial, os seres humanos que agem na contramão. Em vez de cuidar, matam.
Para algum leitor que não tem muita familiaridade com a Bíblia: ela tem alguns livros, escritos no gênero literário apocalíptico (de: “apocalipse”, que significa revelação). Apresentam acontecimentos numa linguagem simbólica e cifrada, entrelaçada por visões, personagens misteriosas, cenas estranhas, gestos inusitados, julgamento final, punição dos ímpios etc.
O mais incisivo deles é o Apocalipse, livro final do Novo Testamento. O historiador, sociólogo e teólogo Jacques Ellul escreve sobre ele: “Podemos considerá-lo como um produto cultural que nos esclarece sobre a mentalidade, a ideologia de certos grupos cristãos do fim do século I e sobre as suas reações face a problemas políticos. E nada mais. Seguramente, nada mais!” (“Apocalipse. Arquitetura em movimento” – p 6 – Ed. Paulinas – 1980). Seu capítulo 6, versículos 7 e 8, que descreve o poder das forças do mal, simbolizadas pelo cavaleiro-morte, na minha visão, parece escrito para hoje. Basta atualizar para o momento brasileiro de agora.
Antes, uma explicação para os versículos citados. Segundo a Bíblia de Jerusalém, os quatro seres vivos (leão – novilho – homem – águia) “representam o que há de mais nobre (leão), de mais forte (novilho), de mais sábio (homem), de mais ágil (águia) na criação”. O apelo é para Jesus Cristo: “Vem!” “Quando abriu o quarto selo, ouvi a voz do quarto Ser vivo que dizia: “Vem!”. Vi aparecer um cavalo [atualização: moto, cavalo de aço] esverdeado [é a cor do cadáver que se decompõe pelo efeito da peste]. Seu montador chamava-se “a Morte” e Hades o acompanhava [Hades: na mitologia grega, o deus da morte, o deus do subterrâneo, portanto das covas]. Foi-lhe dado o poder sobre a quarta parte da terra, para que exterminasse pela espada [atualização: fuzis, metralhadoras, bombas, depredações...], pela fome, pela peste e pelas feras da terra [atualização: discurso do ódio, fakenews, calúnias...]”.
Seria forçar muito interpretar o quarto ser vivo (águia, símbolo da agilidade) chamando Jesus para derrotar o mal, como um apelo para agir o mais rápido possível contra a Covid? O que, infelizmente, não foi feito pelos responsáveis pela nação.
É o que penso. E você?
“Lições de Cigarra” do Evaldo
14 de Outubro de 2021, por João Magalhães 0
Resende Costa tem sido berço de bons poetas. Teve poetas que versejaram poemas até em latim. Caso do Zé Procópio, que foi meu paraninfo quando de minha ordenação sacerdotal. Seu discurso no salão do grupo escolar Assis Resende foi escrito e pronunciado num latim clássico em odes horacianas. Até hoje tenho a cópia ilustrada que ele me deu.
Caso também do Milled Hannas, que deixou belos poemas em latim, assinados com o nome poético: Theofilus a solitudine (Teófilo (amigo de Deus) da solidão). Era prefeito de Resende Costa quando se comemorou o cinquentenário de criação do município. No programa/convite paras os festejos, Milled saúda a cidade com “Carmen ad dilectissimam urbem Resendecostensem” (hino à diletíssima cidade resende-costense), poetando em latim a modo do “Carmen Saeculare”, de Horácio.
Para ilustrar, uma estrofe com livre tradução minha: “Carmine insignem celebrare festo/ Civitatem nunc decet ore pleno/Rupis aeternae positam perite// Culmine summo!” (Agora, faz-se necessário celebrar de boca cheia, com um festivo canto, a insigne cidade, assentada caprichosamente no supremo cume de uma laje eterna) E outros poetas, como o Abel Lara, Terezinha Hannas e José Antônio Oliveira de Resende etc.
Modernamente é o Evaldo Balbino, nosso colega e amigo aqui neste jornal. Meu vizinho até de página, pois, às vezes, nossas colunas saem no mesmo espaço.
Minha experiência com poemas infanto-juvenis foi longa, uma vez que por 22 anos fui professor de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira e também de Literatura Infantil no Curso Normal (atualmente Magistério). O quarto ano era de especialização para o pré-primário, com estágio acompanhado por nós professores. Implicava o estudo e a prática da Literatura Infantil.
Meu primeiro contato com o Evaldo poeta foi quando li seu livro de poemas “Moinho”, que acho um dos melhores que já publicou. Evaldo antecipava o que atualmente vem se chamando de “Escrevivências”, ou seja, o autor transforma suas vivências e influências em arte, em textos, pinturas etc.
Senti o Evaldo transpirando, “suando” numa criativa poesia, sua educação, seu ambiente, suas situações vitais, sobretudo lá no povoado do Ribeirão, onde nasceu. Agora vem seu mais recente lançamento:“Lições de Cigarra”, publicado pela Ed. Helvetia.
Nos muitos anos de ensino de literatura para jovens, sempre insisti com eles que o método de avaliar uma prosa e até uma poesia épica não pode ser o mesmo para a poesia lírica. Se na prosa e na poesia épica você pode comentar as estruturas narrativas, a formação das personagens, a criatividade da trama, o vigor da ambientação, o fluxo da linguagem, na poesia lírica não vejo esta possibilidade.
A avaliação do poema lírico se dá mais pela intuição, pelas agulhadas que ele dá em nossa sensibilidade, pelo clima psicoemocional que cria, pelos versos inusitados, por uma sonoridade rítmica no momento e espaço certos.
Quanto ao poema para crianças – e aproveito para dizer que um poema bom para os pequenos é bom também para os grandes, porque em nós adultos existe uma faixa criança que nunca desaparece – há que se observarem muitas características para ponderá-lo.
Tomo emprestado o conceito de matéria e forma da metafísica aristotélico-tomista para apresentar algumas dessas características. Matéria (ou seja, os temas, os assuntos): animais, brinquedos, brincadeiras, árvores, flores, seres fantásticos, objetos curiosos, partes do corpo, choro, alaridos e tantos outros. No livro do Evaldo: Cigarra, sapo, tanajura, minhoca, saci-pererê, casa, flor, barco e muitos mais.
A forma (isto é, a criatividade na expressão dos temas.): são fundamentais a sonoridade e ritmo, que geram a musicalidade; o drama, que possibilita movimentação, encenação, figurinos; a comicidade, que provoca o riso, a gargalhada, as palmas; a facilidade para decorar (poema orecchiabile, como falam os italianos); a práxis: desenhos, modelagens, colagens; as ilustrações muito necessárias. De preferência, as metonímicas (apresentam só uma parte, a imaginação completa o restante).
E é o momento dos aplausos para a ilustradora Liss Thane. Belíssimas. Amplificam maravilhosamente a significância dos poemas.
Em tudo, o “Lições de cigarra” é opulento. Muito rico. Um primor. Merece o sucesso que está obtendo.
Setembro Amarelo: Posvenção do suicídio
15 de Setembro de 2021, por João Magalhães 0
Isto mesmo, como está escrito: “Posvenção”. Palavra não dicionarizada, mas é o termo que se está usando para significar o trabalho que se faz com os familiares de pessoas que praticaram o suicídio, ou tentaram praticá-lo.
Esta coluna, dada a gravidade dos acontecimentos aqui em nosso município, normalmente no mês de setembro, tem abordado o preocupante problema do autocídio (“Suicídio, você já pensou nisso?- “Setembro Amarelo” -“Setembro Amarelo e a morte autoinfligida”, respectivamente nos números 23, 162 e 197 deste jornal).
Fala-se muito de prevenção; não tanto, porém, da preocupação que se deve ter com os pais, irmãos, familiares e amigos do suicida.
A psicanalista Mônica Marchese Damini (“Setembro Amarelo: pósvenção (sic) do suicídio. Você sabe o que é isso?”) escreve: “Pósvenção (sic) é o suporte ao luto e a prevenção do suicídio aos enlutados e suas futuras gerações. Os sobreviventes são principalmente os familiares, mas também os amigos, os provedores de ajuda, como os bombeiros que prestaram socorro, médicos que fizeram o atendimento, os terapeutas e a comunidade toda que foi impactada pelo suicídio.”
Mônica, que têm experiência nesse trabalho de posvenção, apresenta dados que engendram preocupação. Cinco a dez pessoas são impactadas diretamente pelo suicídio de alguém próximo; as pessoas enlutadas por suicídio costumam ter um luto mais longo e mais difícil, tanto em intensidade como duração, é diferente do luto normal. Existe muita dificuldade em compreender os motivos e atitude do suicida. Os familiares sentem-se abandonados e questionam o porquê de a pessoa não ter sequer pensando neles; os sobreviventes sofrem impactos físicos, sociais, cognitivos e psicológicos e muitas vezes se torturam com a crise do “e se” (E se eu tivesse feito isso? E se eu não tivesse feito aquilo? E se eu tivesse percebido? Etc.).
No suicídio, a dor de quem tirou a vida é transferida para quem ficou. Ficam para a família as culpas, a vergonha de falar no assunto e o afastamento que a própria comunidade acaba fazendo com ela por não saber como lidar com isso ou como falar com ela. E essas pessoas, que precisam tanto de apoio e acolhimento, acabam ficando cada vez mais isoladas. A vida é muito diferente antes e depois do suicídio de alguém amado.
Como a posvenção é basicamente prevenção, uma vez que um suicídio pode motivar outros, há que se desfazer mitos, tais como: os indivíduos suicidas estavam mesmo determinadosa se matar; toda pessoa que pensa em suicídio tem transtorno psiquiátrico; quem fala em se matar quer apenas chamar a atenção; que falar com alguém sobre suicídio pode encorajar a praticá-lo; os suicídios, em sua maioria, acontecem de repente; quando um indivíduo melhora ou sobrevive, não o praticará mais... Há que se diluir preconceitos, como: quem consulta psiquiatra é doido.
Segundo o instituto Vita Alere (latim: “alere”: alimentar, nutrir) de Prevenção e Posvenção do Suicídio, cabem aos sobreviventes do suicídio os direitos seguintes:
- Enlutar-se a seu modo e conforme o tempo que for necessário.
- Saber a verdade sobre o suicídio, ver o corpo do falecido e organizar o funeral, considerando suas necessidades, ideias e rituais.
- Considerar o suicídio como resultante de causas inter-relacionadas que provocaram uma dor insuportável na pessoa que cometeu o suicídio: o suicídio não foi meramente uma escolha.
- Viver plenamente, com alegria e tristeza, livre do estigma ou julgamento.
- Respeitar sua privacidade e a do morto.
- Receber apoio de parentes, amigos, colegas e outros sobreviventes, assim como de profissionais habilitados, com o conhecimento e o discernimento da dinâmica do processo do luto, dos potenciais fatores de risco e suas consequências.
- Entrar em contato com o médico ou cuidador (se houve) que acompanhou a pessoa que cometeu o suicídio.
- Não ser considerado como um candidato ao suicídio ou como um doente mental.
- Compartilhar sua experiência com outros sobreviventes, cuidadores e com todos que buscam a ampliação do conhecimento acerca do suicídio e do luto por suicídio.
- Não se exigir ser a mesma pessoa de antes: há uma maneira de se viver antes do suicídio e outra depois dele.
É o que penso. E você?
LGBTQIA+
19 de Agosto de 2021, por João Magalhães 0
28 de junho é o dia do Orgulho LGBTQIA+. Este ano, houve pouco que comemorar. Talvez a confissão de Eduardo Leite, governador do Rio Grande do Sul, declarando-se homossexual: “Eu não sou um gay governador, sou um governador gay”.
E muito a lastimar: o jovem brasileiro gay, cruelmente assassinado na Espanha, mês passado (ainda bem que houve significativas manifestações de protesto, inclusive do 1º ministro); a lamentável manifestaçãodo Vaticano, em nota diplomática, invocando inclusive a Concordata de São João de Latrão, de 1929, contra o projeto de lei debatido no parlamento da Itália, que criminaliza atos contra pessoas LBTGQIA+; o crescimento da violência de gênero na Argentina: o cerco a gays (caso dos governos da Hungria e Polônia e outros). O retrocesso e o desrespeito aos direitos humanos motivaram essas linhas.
Explicando a sigla do título. Essas mudanças na nomenclatura ocorrem porque, felizmente, a sociedade tem aberto cada vez mais espaço para a discussão e estudo em torno da representatividade de gênero, observando, no entanto, que essas alterações, ou até mesmo os respectivos significados de cada letra da sigla, podem gerar dúvida e confusão
L - lésbica. G-gay. B - bissexual. T- transexual. (Pessoa que assume o gênero oposto ao de seu nascimento. Uma identidade ligada ao psicológico e não ao físico, pois nestes casos pode ou não haver mudança fisiológica para adequação). Q - queer, termo inglês ofensivo (“bicha”). No entanto, as pessoas do grupo se apropriaram dele. Hoje é uma forma de designar pessoas que não se encaixam à heterocisnormatividade, que é a imposição compulsória da heterossexualidade e da cisgeneridade: condição da pessoa cuja identidade de gênero corresponde ao gênero que lhe foi atribuído no nascimento. Por exemplo, alguém que nasceu mulher e se identifica como mulher é cisgênero. O termo cisgênero é o oposto da palavra transgênero. I - intersexo: relativo a pessoas que não se veem adequadas à forma binária (feminino e masculino) de nascença. Ou seja, seus genitais, hormônios etc. não se encaixam na forma típica de masculino e feminino. A - assexual (pessoas que não possuem interesse sexual). O mais (+) serve para abranger a pluralidade de orientações sexuais e variações de gênero.
O “Dicionário Básico de Filosofia” (Jorge Zahar Editor, 3ª ed.) define o preconceito como “opinião ou crença admitida sem ser discutida ou examinada, internalizada pelos indivíduos sem dar conta disso, e influenciando seu modo de agir e de considerar as coisas. O preconceito é constituído, assim, por uma visão de mundo ingênua que se transmite culturalmente e reflete crenças, valores e interesses de uma sociedade ou grupo social. Entretanto, é preciso admitir que nosso pensamento inevitavelmente inclui sempre preconceitos, originários de sua própria formação, sendo tarefa da reflexão crítica precisamente desmascarar os preconceitos e revelar sua falsidade”.
O ser humano, desde que foi se destacando dos animais pela autoconsciência, sempre vive mergulhado em preconceitos. Morre um ou outro, mudam os objetos, as formas, mas continuam gerando estragos e injustiças, causando violência, engessando comportamentos. Os tempos futuros serão assim? Quem vai saber?!
Pesquisas mostram. Segundo José Leon Crochik, da Universidade de São Paulo (“Preconceito, indivíduo e sociedade”), o preconceito não é inato, embora haja indivíduos mais predispostos. Ele se instala no desenvolvimento individual como um produto das relações entre os conflitos psíquicos e a estereotipia do pensamento. Uma das questões centrais sobre o preconceito refere-se a como se dá a relação entre os aspectos psíquicos e sociais na sua constituição. Ou seja, ao mesmo tempo que podemos afirmar que o indivíduo predisposto ao preconceito independe dos objetos sobre os quais ele recai, podemos dizer também que o objeto não é totalmente independente do estereótipo apropriado pelo preconceito que lhe diz respeito. O estereótipo em relação ao negro não é o mesmo daquele que se volta contra o judeu, que, por sua vez, é diferente do estereótipo sobre o deficiente físico.
Portanto, a dissolução do preconceito caminha pelas mudanças sociais e pela educação. Já os atos e atitudes motivadas pelo preconceito se combatem pela repressão legal que os criminaliza. E pela vontade política. Claro, leis bem feitas, com boa aplicação, ou seja, eficazes.
É o que penso. E você?
“Levantai-vos, soldados de Cristo...”
15 de Julho de 2021, por João Magalhães 0
Finalizando a série sobre a antiga poesia litúrgica católica, converso com os leitores sobre alguns hinos que cantávamos nas cerimônias religiosas de um passado já um tanto remoto. Hinos muito populares como: “Levantai-vos, soldados de Cristo”, “Queremos Deus”, “Coração Santo”, “A nós descei, divina luz”, “Eu quisera, Jesus Adorado”, “Louvando a Maria”, “Virgem Mãe Aparecida”, “Com minha mãe estarei”, “Viva a mãe de Deus e nossa”, “Bendito, louvado seja” e outros.
Atualmente, talvez devido às muitas gravações, os tenho ouvido nos alto-falantes de igrejas católicas, inclusive das de Resende Costa. Cito, como exemplo, a gravação do “Queremos Deus”, de Milton Nascimento e os Tambores de Minas, que acho um primor, sobretudo com o solo de flauta inicial. E, para quem gosta, recomendo também a gravação de “Coração Santo”, do recém falecido Agnaldo Timóteo.
Quem serão os compositores das letras e das melodias? Resposta difícil, pois muitas são muito antigas e algumas vêm de tradições populares. Do “Levantai-vos, soldados de Cristo” há gravações com uma letra bastante modificada, atribuída ao padre João Clá Scognamiglio Dias, fundador dos “Arautos do Evangelho”.
Os compositores do hino original por enquanto são desconhecidos. Para divertir um pouco: entre nós seminaristas, corria a história de um cantor de ouvido ruim que cantava o verso “O pendão de Jesus Redentor” assim: O cordão de Jesus rebentou!
“Queremos Deus”: hino muito antigo de tradição popular italiana. “Noi vogliam Dio” (Nós queremos Deus). Tornou-se hino oficial do Estado Pontifício a partir de 1800 e o foi até 1857. Difundiu-se, contudo, como melodia litúrgica num segundo momento. Daí sua imensa popularidade. Não consegui informação de quando foi traduzido para o português na versão tradicional.
“Coração Santo”: a composição é de Tiburtino Mondin, poeta santista do final do século 19.
“Eu quisera, Jesus adorado”: composição de Francisca Butler, de origem irlandesa – o que explica seu fervoroso catolicismo.
“Virgem Mãe Aparecida”: música do Pe. João Batista Lehmann, autor da “Harpa de Sião”, livro de cantos a uma ou mais vozes, com acompanhamento de harmônio, bastante popular e utilizado em todas as igrejas e capelas católicas do Brasil, até o Concílio Vaticano II. Da Congregação do Verbo Divino, foi também diretor do “Lar Católico”, jornal de larga influência na formação católica em nossa região. A letra é do poeta mineiro Belmiro Braga (1872-1937), nascido num povoado que, mais tarde, tornando-se município, adotou seu nome.
“Viva a mãe de Deus e nossa”: Em 1905, o conde José Vicente de Azevedo compôs sua letra e música numa viagem de São Paulo a Santos. Como não tinha papel, escreveu nas bordas de um jornal. Em 1951, o cardeal arcebispo de São Paulo, dom Carlos Carmelo de Vasconcellos Mota, tornou oficial o “Hino à gloriosa Padroeira do Brasil”.
Numa época litúrgica em que os presentes nas cerimônias eram mais ouvintes (quando ouviam) que participantes, esses hinos tiveram uma função importante. Um fator de participação. Suas melodias, muito orecchiabili, como dizem os italianos, muito entoáveis, sonorizando letras ritmadas, cheias de estribilhos e bis e rimadas, provocavam um clima emocional de participação nas missas e procissões.
Mais ainda quando acompanhadas pelo harmônio nos templos e pela banda de música nas procissões e rasouras. (Por falar em rasoura, sugiro assistir pela internet um vídeo da rasoura das Dores com a banda Santa Cecília em Resende Costa, ano 2019).
É o que penso. E você?
P.S: Não consegui, igualmente, informações quanto ao “A nós descei, divina luz”, “Louvando a Maria”, “Bendito, louvado seja” “Com minha mãe estarei” (que está, salvo engano, com a letra modificada). Se algum leitor souber, por favor informe-me: ([email protected]).