Gastronomia

De Portugal à Itália, via Resende Costa – 2ª. parte

12 de Setembro de 2012, por Cláudio Ruas 1

Continuando a prosa sobre o velho mundo, de Portugal seguimos para a França, a capital da gastronomia mundial.

Lembram-se os leitores do causo aqui contado do mineiro da roça que foi pra Paris e descobriu que o confit de porc era a nossa carne de lata? Então, quando se conhece mais de perto a gastronomia francesa a gente percebe que ela é mais simples do que imaginamos. Mas com um diferencial: eles valorizam ao máximo o ingrediente, o produto e a técnica. Além disso, passaram a dar um refinamento à comida que tornou a gastronomia francesa uma referência e até mesmo uma base para execução de outras culinárias.

Impressionante como eles valorizam a comida, desde o morador da zona rural até o parisiense, que se assenta todos os dias em um tradicional “café”, que por lá tem aos montes, muito charmosos, aonde não vão só pra tomar café, mas pra comer e beber outras coisas, principalmente os vinhos maravilhosos. Que por sinal são mais baratos do que aqui no encarecido Brasil, assim como algumas comidas e hotéis.

Além da carne de lata, muitas são as comidas e ingredientes que também vemos por aqui. Cito dois pratos típicos e servidos até em restaurantes sofisticados, que são o coq au vin e o boeuf bourguignon. O primeiro é um frango ensopado parecido com o nosso, porém, com vinho no cozimento. E o segundo é uma carne cozida lentamente, geralmente o músculo do boi, muito parecido com a nossa carne de panela, feita na tranquilidade do fogão à lenha. O triste é que aqui no Brasil essa não tem tanto valor como deveria. Já vi em um restaurante pomposo uma mulher torcer o nariz ao saber que aquele prato chique e caro que ela acabou de comer - e adorar - era feito com carne de segunda. Na França isso é diferente, pois os ingredientes são valorizados e apreciados sem pré-conceitos e rótulos, do caviar ao pé de porco.

Dois ingredientes indispensáveis para eles são a mostarda (amarela escura e bem pastosa) e a manteiga, muito bem feitos e usados de forma bem generosa, principalmente a última. Ao ver a quantidade de manteiga de uma receita, o que se pensa é que eles seriam gordos. Mas não, são magros. O segredo? Comer de tudo um pouco, sem excesso e com produtos de qualidade. E olha que eles têm catalogados mais de 365 tipos diferentes de queijos, um para cada dia do ano e um melhor do que o outro, consumidos com pães espetaculares. No cardápio francês as aves também têm um lugar especial, como o frango, a galinha d’angola e o pato, cujas partes mais apreciadas são o peito (grelhado ou curado com sal), a coxa (geralmente cozida na gordura do próprio bicho, o confit de canard) e o fígado, que é considerada uma das grandes iguarias do país. É dele que se produz o famoso foie gras, que é o miúdo de um pato (ou ganso) engordado em excesso, servido in natura ou então processado, cozido ou em forma de patê.

Mas uma das coisas mais ricas que a França tem são suas feiras de rua. Bem presentes no cotidiano, geralmente são montadas aos sábados e chamam a atenção pela organização e pela qualidade e variedade dos produtos, muitas vezes vendidos pelo próprio produtor (até mesmo no coração de Paris), sem atravessador, frescos e muito bem cuidados. Praticamente não é preciso escolher o ingrediente na banca, tamanha a perfeição dos produtos. É um convite e tanto pra cozinhar muito - e bem - ou simplesmente fazer um belo piquenique em uma praça ou parque. Algo comum por lá e cada vez mais incomum por aqui, uma pena.   

Pena também saber que poderíamos ter feiras bem estruturadas, principalmente aqui em Resende Costa, onde compraríamos o que é produzido à nossa volta, com muito mais qualidade e sustentabilidade, valorizando o homem do campo, nossas tradições e resolvendo ainda uma série de problemas sociais e econômicos. Que o poder público - principalmente agora em tempos de eleição - pense com carinho nesse assunto, que não morre nesse artigo.
 
(A receita desse mês no nosso blog é um clássico francês, delicioso, barato e muito fácil de fazer: a Sopa de Cebola: http://casalgastromg.blogspot.com.br/2012/08/sopa-de-cebola.html)

De Portugal à Itália, via Resende Costa

13 de Agosto de 2012, por Cláudio Ruas 0

“Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto.”

Essa brilhante citação é do aventureiro brasileiro Amyr Klink, que já rodou o mundo de barco e escreveu excelentes livros. O que ele diz é a mais pura verdade: nós precisamos viajar. Nem que seja para a fazenda ao lado. Mas se der pra ir mais longe, melhor ainda. E quando se aprecia a gastronomia, a viagem fica ainda mais interessante e instrutiva, pois a comida é o reflexo do povo e do lugar.

Foi por essas e outras que recentemente realizei um sonho de fazer uma viagem gastronômica para o velho mundo e me sinto na obrigação de compartilhar um pouco do que vi com vocês, em três etapas, uma para cada país visitado: Portugal, França e Itália.

Melhor lugar para começar como Portugal não haveria, já que parte do nosso “DNA” gastronômico é de lá. E para entender melhor da nossa comida é preciso conhecer mais a portuguesa, que não vive só de bacalhau.

É fato que o fantástico bacalhau é muito forte na gastronomia deles (dizem que existe uma receita para cada dia do ano), assim como outros pescados como a sardinha e frutos do mar, pois o país tem uma grande faixa litorânea, do mediterrâneo ao atlântico. Mas a comida do interior, de montanha, também é importante e é nela que enxergamos parte da nossa origem e costumes gastronômicos.

A começar pelo grande consumo da couve, a “dona” da nossa horta, usada não só no “caldo verde” de batata, mas até mesmo com bacalhau e em muitos outros pratos, como em um feijão fradinho com paio que experimentei, muito parecido com o nosso querido tropeiro. O feijão também é presente e nos mostra que a origem da feijoada brasileira não é bem como diz a lenda, que atribui a criação aos escravos. Existe um preparo similar, porém com feijão branco na maioria das vezes, linguiças e miúdos, que por sinal são muito valorizados por lá, assim como em muitos países da Europa, um exemplo a ser seguido. O porco então é a matéria prima utilizada para os magníficos embutidos, muito apreciados e bem feitos, inclusive defumados nos “fumeiros” (defumadores). Há uma grande variedade de enchidos (como a linguiça), caso da “farinheira”, na qual é utilizada farinha de trigo ou de pão no enchimento, e a “negrinha”, espécie de chouriço defumado. Os ensopados e cozidos (com legumes, verduras, carnes, aves e embutidos), são deliciosos e nos remetem à comida molhada da fazenda. Falando em fazenda, lembramos ainda dos doces, da grande utilização de ovos no seu preparo e da forte ligação do nosso queijo minas com um dos queijos mais tradicionais de Portugal, o “Serra da Estrela”. Já falamos dele por aqui, mas não custa lembrar que a nossa técnica de preparo foi inspirada na deles, porém, com a utilização do leite de vaca ao invés do de ovelha.

Com certeza ainda existem muitos outros pontos em comum entre nós, o que me instiga a me aprofundar mais nesse assunto. Por ora, prefiro mencionar as demais maravilhas da riquíssima gastronomia lusitana, como seus azeites e azeitonas espetaculares, pães muito bem feitos, batatas saborosíssimas, confeitaria impecável, vinhos especiais e únicos no mundo e muitas outras coisas. Percebi também que felizmente o país tem sido cada vez mais valorizado e procurado pelos turistas, que antes só tinham olhos – e bocas - para outros cantos europeus.

E o melhor: nada disso está tão distante, difícil e caro como imaginamos. Primeiro, porque sai da nossa capital um voo diário sem escalas com apenas 9 horas de duração até Lisboa, lugar onde muitas coisas custam menos do que no Brasil. Segundo, porque Portugal também está aqui, dentro da gente.

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Aprenda uma deliciosa receita de “salada de feijão branco com couve e bacalhau” no nosso blog: http://casalgastromg.blogspot.com.br/ e não deixe de aproveitar o 15º Festival de Cultura e Gastronomia da nossa vizinha Tiradentes, entre 24/08 e 02/09!

Os donos do pomar

12 de Julho de 2012, por Cláudio Ruas 0

Se na edição passada nós tratamos da “dona da horta” - a tão cultivada e apreciada couve - nesse mês vamos falar dos “donos do pomar”, sobretudo nessa época do ano em que estamos.

É claro que nossos pomares mineiros geralmente têm uma variedade interessante de frutas, mas, dentre elas, algumas se destacam, seja pela predominância ou pelo consumo, principalmente nesse período: a laranja, a mexerica e o limão.

A chegada da temporada de seca, a princípio, daria uma idéia de falta de vida e fartura na roça, porém, não é bem isso que acontece. A natureza é sábia e sabe muito bem aproveitar a época “das águas” e, quando ela se vai, em seguida vêm os frutos, principalmente os cítricos, perfeitos contra os resfriados do inverno.

Junho e julho, para mim, são meses especiais na roça por uma série de motivos, a começar pela beleza dos dias e das noites. Mas, a abundância do pomar é o que mais me fascina, ao ponto de dar vontade de sair da capital só pra ir encher a carroceria de laranja serra d’água, mexerica candongueira, limão capeta...

Na roça, sair da cama no inverno é ruim, mas ir se esquentar no sol chupando mexerica ao lado de um pé carregado é algo sublime, assim como fazer o suco dela misturado com a laranja, usar o caldo pra preparar uma carne de porco ou então comer aquele doce de casca de laranja com queijo minas e umas gotas de limão pra equilibrar perfeitamente com o açúcar.

Falar que essas frutas fazem bem pra saúde é chover no molhado, pois todos já sabem. Então, acho que devemos pensar mesmo é no tanto que elas podem ser mais exploradas e valorizadas, principalmente por aqueles sortudos que têm essa fartura toda à sua volta e não sabem o que é pagar R$ 4,00 no quilo de mexerica ruim na cidade grande.

Bem fazia meu querido avô - o velho Góes - que sempre aproveitava a fartura de laranja pra fazer vinho, o que praticamente não se vê mais hoje em dia, salvo exceções, como a do Mazinho do Saneco, que ainda produz a iguaria.

O limão, então, é uma fruta das mais especiais, principalmente pela sua utilidade na cozinha: tirar a “mardade” da carne de porco, marinar peixes, refrescar e temperar uma costelinha e um torresmo fritos, temperar molhos e saladas e até “cozinhar” um pescado sem que esse vá ao fogo, apenas com seu poder de reação química em função da acidez. Caso do delicioso “ceviche”, prato típico das culinárias peruanas e chilenas e que cada vez mais faz sucesso mundo afora, muito fácil de se fazer: picar em cubos pequenos um filé de tilápia fresca (congelada não é possível) e misturar com cebola roxa fatiada, suco de limão, sal, azeite e coentro (ou salsinha). Esperar uns 10 minutos (tempo para que o limão e o sal “cozinhem” o peixe) e servir. Experimente sem medo, o peixe não estará cru! Aproveite também para experimentar usar mais essas frutas no preparo de comida salgada, o que às vezes vai de encontro aos nossos costumes. Temperar e assar uma costelinha com um pouquinho de suco de laranja não vai deixá-la doce e estranha, muito pelo contrário. Ficará macia, suave e com uma cor linda e dourada.

Se o limão é minha fruta favorita, o capeta é o meu preferido, pois tem um sabor diferenciado, adocicado e único, além de ser bastante rústico e produzir por mais tempo. Mas o mais interessante é a quantidade de nomes diferentes que vemos por aí em relação ao limão capeta: limão rosa, limão de moça, limão do rio, limão bergamota, laranja capeta, mexerica capeta etc., o que mostra a sua presença na nossa cultura.

Por fim, como já disse em outra ocasião, dói no peito ver alguém na roça gastando dinheiro pra tomar suco artificial ou refrigerante enquanto nem os passarinhos dão conta de tanta fruta gostosa, saudável e DE GRAÇA no pé.

Recusar esse presente da natureza é pecado bem pior do que o da gula...  

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(Quem quiser aprender uma receita fácil de “lombo de panela ao molho de mexerica”, basta acessar o nosso blog: casalgastromg.blogspot.br.)

Comida festeira

13 de Junho de 2012, por Cláudio Ruas 0

"Nesta edição especial de aniversário de 100 anos da nossa Resende Costa, a gastronomia não poderia ficar de fora. Mas, para isso, decidi "passar a colher" para uma pessoa muito mais gabaritada pra tratar dessa história, a minha querida Tia Lucinha, a Lucinha do Góes. Além de grande cozinheira e referência para mim, ela é uma enciclopédia viva da cozinha e será sempre muito bem-vinda neste nosso espaço!"

Nossa amada cidade está apagando velinhas – cem! Estivemos conversando sobre os comes e bebes das festas oficiais quando nossa gente não andava pelo mundo vendo as modas como andam hoje. Até as palavras foram trocadas. Não se fala mais em banquete como antigamente. Os almoços de confraternização de hoje acontecem em locais apropriados, com cardápio variado, filmagens, decoração segundo a exigência da data, cerimonial e tudo mais. Como teriam sido os festejos em 1912, quando o Arraial da Lage se tornou cidade?

Com certeza, após os discursos, missa solene e foguetes, aconteceu um lauto banquete para as autoridades presentes. Onde terá sido? Nos meus tempos de criança todos os comes e bebes das festas e recepções aconteciam no Grupo Escolar Assis Resende. Fotos bem mais antigas do que eu, como as da visita a Resende Costa do Presidente do Estado, o doutor Antônio Carlos, podem comprovar o que eu digo. Havia na cidade senhoras conhecedoras das etiquetas em vigor, cozinheiras experts em banquetes e ainda outros especialistas, como o Tio Alfredo, que sempre era encarregado de preparar a estrela da festa, a leitoa! O cardápio não variava muito, mas deveria ter um sabor incrível. Crianças ficavam de fora, mas observavam tudo. E melhor ainda, estavam sempre atentas às conversas dos adultos sobre os sucessos e insucessos do evento.

Voltando ao cardápio, os pratos eram servidos todos bem exibidos, sobre mesas armadas em cavaletes no salão nobre da escola. O vasilhame vinha das casas mais abastadas: travessas, terrinas, compoteiras belíssimas, licoreiras etc. No centro da mesa um quarteto indispensável: macarronada, tutu de feijão, frango frito e a leitoa.  Arroz e farofa eram meros coadjuvantes. Não se falava muito em salada naquele tempo.

O visual da mesa coberta por toalhas brancas, louças elegantes e guardanapos dobrados em forma de pássaro ou flor eram belíssimo! A leitoa, rainha da festa, era bem pururucada e aparecia enfeitada com olhos de azeitona, pãozinho na boca, docemente reclinada num leito de farofa de miúdos cheirando a salsa. Sempre tenho pena delas assim, mas brilhavam tanto e cheiravam tão bem! A farofa era amarelinha, feita de farinha de milho e úmida da gordura do bichinho.

Os franguinhos, esses eram gloriosos! Fritos também, inteiros, dourados e recendendo a pimenta do reino! Todos bem caipiras mesmo, criados com milho, suculentos e saborosos. A macarronada, versão brasileira das massas italianas, nunca faltava nas mesas festivas, seja em recepções ou nas casas. O molho era bem vermelhinho com tomate, cebolas e principalmente a massa de tomate. A iguaria vinha sempre fartamente salpicada de queijo Minas curado, salsa e cebolinha.

O tutu de feijão merece um parágrafo inteirinho só para ele. Feito em banha de porco, farto, brilhante, enfeitado e guarnecido com pedaços generosos de linguiça, molho de tomate e cebola e rodelas de ovos cozidos, parecia palheta de pintor!

Satisfeitos com a comilança, certamente regada a “vinho de mesa”, como se dizia na época em que não havia fartura de refrigerantes nem geladeira para esfriar a cerveja. As travessas mexidas eram rapidamente removidas para dar lugar à sobremesa. Essa sim, era digna de um banquete! Ao lado de um delicioso queijo fresco, a policromia das compoteiras exibia os doces de frutas em calda, doce de coco de colher com gemas bem amarelinhas, doce de leite mole e o insubstituível arroz doce salpicado de canela. Mas, desta vez, a estrela era o pudim. Antes das latas de leite condensado era feito à base de ovos, aos quais se juntava queijo ou coco, e vinha boiando na calda de caramelo.  

E, para aquecer os discursos, antes vinham as licoreiras com seus néctares: licor de leite, de abacaxi, de maracujá, de anis. Essa era realmente a bebida de antigamente, oferecida às visitas, nos nascimentos, casamentos e em toda ocasião festiva, para desespero da criançada que não podia sequer provar.

Me perguntem como soube disso tudo. Em criança, acompanhava minha madrinha, a Sá Donana, requintada dona de casa e hábil organizadora de festas, esposa de um dos nossos ex-prefeitos, o senhor Antonio de Souza Maia Júnior, mais conhecido como Nico de Souza. Mais tarde, como professora, eu era convidada a servir. Aliás, fazia parte das nossas funções de professoras servir à mesa as autoridades civis, militares e religiosas em visita à cidade.

Para o grande público, na festa de 1912, deve ter acontecido mais ou menos o que era comum nas posses dos prefeitos. Dezenas de garrotes eram abatidos e a carne assada em churrasquinhos. Os mais espertos se fartavam, chegavam até a pescar as varetas pelos buracos da garagem da prefeitura antiga. Os menos espertos, depois dos discursos corriam para saciar a fome em casa mesmo. A bebedeira era certa, e para muitos, a festa terminava na cadeia. Mas havia sempre banda de música, foguetes e aquele ar gostoso de festa do interior, com as moças nos seus melhores vestidos e os rapazes as admirando. Eram tempos inocentes do footing na avenida e dos “flertes”. Quanta saudade!

Maria Lúcia Pinto

A dona da horta

14 de Maio de 2012, por Cláudio Ruas 0

Com tanto assunto pra escrever aqui na nossa coluna eu estava duvidoso sobre qual seria o tema desta edição. Até que um almoço na casa da Dona Lia (minha avó materna) acabou com a dúvida: hoje vamos de couve. E refogada na gordura de porco.

Apesar da variedade de verduras de folha que consumimos e adoramos por aqui em Minas, a couve é a “dona da horta”. Tanto é que no interior ainda se chama a horta de “horta de couve”.

A couve costuma ser apenas um coadjuvante de uma refeição, servindo de acompanhamento ou ingrediente, mas é impressionante como ela é indispensável e quase nunca sobra. A feijoada, o tropeiro, o frango e o angu geralmente sobram nas farturentas mesas mineiras, mas reparem que a couve costuma sempre acabar!

O preparo é simples, mas alguns detalhes e cuidados fazem muita diferença. A couve é bastante delicada e não pode com muito calor na panela (a variedade com talo roxo é mais resistente). O ideal é que ela seja refogada praticamente cozinhando e, para isso, uns pingos de água no refogado ajudam bastante. Assim como deixá-la cortada de molho na água, quando fica bem hidratada e suporta melhor o fogo. Já se a couve estiver picada extremamente fina – como muitos adoram e defendem – ela fica mais exposta ao calor e tende a ressecar e embolar. Na minha opinião, a couve bem fininha funciona melhor  em saladas, caldos e para ser misturada ao mexido e ao feijão tropeiro. No caso do tropeiro, outra dica: não refogue, apenas misture com os outros ingredientes que já estão na panela, pois só o calor desses já será suficiente para cozinhá-la, sem perder seu frescor, deixando ainda o prato mais leve e menos calórico.

Rasgada com a mão ou picada em quadrados de dois centímetros a folha fica mais suculenta, pois sua área de exposição ao calor é menor, e combina perfeitamente para se comer com o angu, seu fiel parceiro.

Há os que costumam refogá-la no alho, mas, penso que o sal já é suficiente para o tempero, evitando ainda o risco de amargar, como ocorre com o alho frito excessivamente.

Mas o grande diferencial é o uso de gordura de porco, seja a da “lata”, ou a que sobrou da fritura do bacon ou até mesmo a banha comprada no supermercado. Uma vez ou outra ela não vai te matar (nem engordar), o que permite ainda colocar uma quantidade mais generosa. Como se diz na roça, couve que se preze tem que ser “lumiano” na panela, brilhando lá de longe.

Terminando o preparo, é bom ter cuidado com o calor que fica na panela mesmo desligada, sendo interessante transferi-la a uma vasilha para não continuar cozinhando e amarelar (ou então desligar o fogo com antecedência).

Galinha gosta de talo de couve não é à toa, portanto, não os jogue no lixo. Bem picado, podem ser refogados juntamente com a folha ou irem pra farofa ou risoto, que vão ficar nutritivos e crocantes. Já experimentou bater no liquidificador uma folha com suco mexerica ou laranja? E charutos de couve, recheados com purê de abóbora e linguiça, gratinados no forno com queijo curado? (Antes de enrolar os charutos, amoleça as metades da folha em água morna por um minuto).

Enfim, dá pra fazer muita coisa boa e diferente com a couve, mas pra mim a melhor mesmo sempre vai ser a tradicional, “lumiano”, com angu, arroz, feijão e costelinha da lata. De preferência feita pela Dona Lia, como naquele almoço que me deu a idéia do artigo, com couve fresca lá das bandas da Serra da Moeda. E o mais interessante é que, há anos, observo e tento aprender a técnica do preparo com a vovó. Repito seus passos sistematicamente (à exceção da couve cortada à mão, que não consigo e me rendo à tábua), mas nunca fica - e nem vai ficar - igual e perfeita como a dela. Coisas da gastronomia...
 

(Informo aos leitores que, a partir de agora, teremos um canal eletrônico para estender essa nossa conversa. Eu e minha esposa criamos o “CASAL GASTRÔ”, um blog de receitas, fotos, ideias etc., e que servirá de extensão aos assuntos aqui tratados. Falando em couve, teremos duas receitas legais e fáceis: “farofa de couve com paio” e “bacalhau com baroa escondido na couve”.

O endereço é: http://casalgastromg.blogspot.com.br/. Aproveitem!)