Anjos na Bíblia
27 de Marco de 2024, por João Magalhães 0
Como esta coluna aborda assuntos de concordância da maioria (o verso) e assuntos polêmicos em que muitos discordam (o controverso), muitas pessoas, sabendo quem fui, de vez em quando me perguntam: existem anjos? Existem demônios? Minha resposta é: depende de sua fé.
Como muitas pessoas têm a Bíblia como fundamento de suas crenças, resolvi fazer uma seleção dos momentos em que a Bíblia fala dos anjos bons e dos anjos maus: os demônios, o diabo, belzebu, satanás etc. Digo seleção porque são inúmeros esses momentos e não dá para apresentá-los todos. Quem tem a Bíblia da editora Ave Maria, dos padres claretianos, pode conferir em seu índice bíblico doutrinal, consultando os verbetes “anjo” e “demônio”.
A crença na existência de um mundo espiritual é comum a quase todas as religiões e anjos fazem parte dessa crença, tanto os anjos bons como os maus. O que varia são suas funções, sua hierarquia, seus nomes etc. Eles aparecem nas culturas pagãs como seres divinos ou como seres fantásticos, gênios, fenômenos da natureza e outros mais, cumprindo decretos dos deuses, sendo seus mensageiros.
Nomes dos anjos bons: Miguel (do hebraico mikael, que significa “quem é como Deus?”). É chamado de arcanjo na epístola de São Judas (1,8), que cito: “E, no entanto, o arcanjo Miguel, quando disputava com o diabo, discutindo a respeito do corpo de Moisés, não se atreveu a pronunciar uma sentença injuriosa contra ele[Moisés]”. Arcanjo porque tudo indica que tem uma liderança sobre os outros anjos.
Gabriel (do hebraico gabhri’el, que significa “homem de Deus”). Basta citar o Evangelho segundo Lucas (1.26): “No sexto mês, o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma cidade da Galileia, chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um varão chamado José, da casa de Davi; e o nome da virgem era Maria”.
Rafael (do hebraico rafa’el, que significa “ele curou”). Aparece, pelo que eu saiba, apenas no livro de Tobias (3,16 e 5,4-27), com quem Tobit, o pai de Tobias, tem uma longa conversa. Tobias está cego e Rafael cura-o da cegueira.
Há também classes ou tipos de Anjos. Querubins: são tipos de guardas celestiais em constante exaltação a Deus. Aparecem logo no primeiro livro da Bíblia. Gênesis 3,24: “Ele baniu o homem e colocou, diante do jardim do Éden, os querubins e a chama da espada fulgurante para guardar o caminho da árvore da vida”. Serafins: são uma classe de anjos muito aproximada dos querubins. Duas vezes descritos pelo profeta Isaías (6,2-3 e 6,6): “ Vi o Senhor sentado sobre um trono alto e elevado. A cauda da sua veste enchia o santuário. Acima dele, em pé, estavam os serafins, cada um com seis asas: com duas cobriam a face, com duas cobriam os pés e com duas voavam... nisto, um dos serafins voou para junto de mim, trazendo nas mãos uma brasa que havia tirado do altar com uma tenaz, com ela tocou-me os lábios...”. Principados, Potestades, Tronos e Domínios: muito citados nas epístolas de São Paulo (Efésios 1,21 e Colossenses 2,10) e também na primeira epístola de São Pedro (3,22). São classes de anjos que ocupam lugares de autoridade entre os seres angelicais. Há uma ideia de certa hierarquia entre esses seres, pois têm funções de chefias ou são príncipes de anjos.
Resta comentar um pouco sobre os anjos no livro mais enigmático e simbólico do Novo Testamento, que é o Apocalipse. Aproveito para aconselhar o leitor com pouca familiaridade com o Apocalipse a introdução que a Bíblia de Jerusalém faz sobre ele. O Apocalipse fala bastante sobre os anjos bons e também sobre os anjos maus (2,9-10; 12,7-12; 14,15; 9,1-11; 16,13-14; 20,7-10).
Cito 12,7-12: “Houve então uma batalha no céu: Miguel e seus Anjos guerrearam contra o Dragão. O Dragão batalhou, juntamente com seus Anjos, mas foi derrotado e não se encontrou mais um lugar para eles no céu. Foi expulso o grande Dragão, a antiga serpente, o chamado Diabo ou Satanás, sedutor de toda a terra habitada. Foi expulso para a terra, e seus Anjos foram expulsos com ele”.
Por fim, após lembrar ao leitor o capítulo 13, que fala da besta e seu número (666), que, conforme muitos exegetas, simboliza o Império Romano com seus imperadores perseguidores dos cristãos (talvez o imperador Nero, ou talvez o imperador Domiciano), finalizo com o capítulo 14,6-13, que anuncia a presença de mais de 3 Anjos e citando o versículo 13: Escreve: “felizes os mortos, os que desde agora morrem no Senhor. Sim, diz o Espírito, que descansem de suas fadigas, pois suas obras os acompanham”.
Homenageando um dos maiores poetas do Romantismo brasileiro: Antônio Gonçalves dias (centenário de sua morte)
28 de Fevereiro de 2024, por João Magalhães 0
Nossa cidade se orgulha de ter excelentes poetas. Alguns poetando até em latim. Caso do Miled Hannas e do Zé Procópio. É justo, portanto, que se homenageie um dos maiores poetas, junto com Castro Alves, do Romantismo brasileiro, na minha opinião.
Lamento não ter aqui comigo a mais completa biografia de Gonçalves Dias, escrita por Lúcia Miguel Pereira. E peço desculpas ao leitor por citar muita coisa de memória que, óbvio, pode ter falhas.
Sobre sua biografia, apenas algumas pinceladas. Nos tempos atuais em que os indígenas são tão maltratados, abandonados e muitas vezes mortos, lutando por suas terras originárias, há que se lembrar de Gonçalves Dias, que, junto com José de Alencar, valorizou muito a cultura e os valores indígenas em suas obras literárias. Ele é o fundador da literatura indígena na poesia, como José de Alencar o é na prosa. São pioneiros. Ainda bem que com a nova política atual uma literatura com temas indígenas começa a aparecer!
Nasceu em Caxias, Maranhão, a 10 de agosto de 1823, e aí faleceu, afogado, em três de novembro de 1864, pois o navio francês Ville de Boulogne, no qual regressava de sua terceira viagem à Europa, naufragou no litoral do Maranhão.
Desde estudante de literatura brasileira no colegial, fiquei fascinado por ele. Copiava muitos poemas dele e até decorava alguns, como “Gigante de Pedra”, em que descreve um morro carioca. Cito a primeira estrofe: “Gigante orgulhoso de fero semblante/ Num leito de pedra lá jaz a dormir/ Em duro granito repousa o gigante/ Que os raios somente puderam fundir”.
Como a “Canção do Tamoio” primeira estrofe: “Não chores, meu filho/ Não chores que a vida/ É luta renhida/ Viver é lutar/ A vida é um combate/ Que os fracos abate/ Que os fortes, os bravos, só pode exaltar”.
Como “Y Juca Pirama”, considerado o mais perfeito poema épico indianista da literatura brasileira, desenvolvido em dez cantos, que focaliza o lamento do guerreiro tupi, preso em uma aldeia Timbira. Para quem não tem ideia, apresento duas estâncias: “No meio das tabas de amenos verdores? Cercada de troncos, cobertos de flores/ Alteiam-se os tetos d’altiva nação/ São muitos seus filhos, nos ânimos fortes/ Temíveis na guerra, que em densas coortes/ Assombram das matas a imensa extensão/ São rudes, severos, sedentos de glória/ Já prélios incitam, já cantam vitória/ Já meigos atendem à voz do cantor. São todos Timbiras, guerreiros valentes/ Seu nome lá voa na boca das gentes/ Condão de prodígios, de glória e terror!”
Como o mais conhecido de seus poemas, “A canção do exílio”: (“Minha terra tem palmeiras, onde canta o sabiá/ As aves que aqui gorjeiam/ Não gorjeiam como lá/ Nosso céu tem mais estrelas/ Nossas várzeas têm mais flores/ Nossos bosques têm mais vida/ Nossa vida mais amores/ Em cismar, sozinho, à noite, mais prazer encontro lá/ Minha terra tem palmeiras/ Onde canta o sabiá”).
Como “Marabá”: (“Eu vivo sozinha, ninguém me procura/ Acaso feitura não sou de Tupá?/ Se algum homem de mim não se esconde/ Tu és, me responde/ Tu és Marabá”.
Como a “Canção do Piaga” (“Ó guerreiros da Taba/ Ó guerreiros da Tribo Tupi/ Falam deuses nos cantos do Piaga/ Ó guerreiros, meus cantos ouvi/ Esta noite – era a lua já morta – Anhangá me vedava sonhar;/ Eis na horrível caverna, que habito/ Rouca voz começou-me a chamar”).
São alguns exemplos de poemas indigenistas, mas foi um poeta mais amplo. Cantou o amor, a natureza, a pátria, a religião.
Sua grande paixão na vida foi Ana Amélia, mas, por ser mestiço, a família proibiu o casamento. Essa proibição trouxe-lhe penosos sofrimentos, porém inspirou-lhe alguns poemas de amor: “Se se morre de amor”, “Minha vida e meus amores” e o mais célebre deles: “Ainda uma vez – Adeus”, quando o poeta se encontrou com ela em Portugal, ela já casada, em 1854. Eis uma parte da letra: “Enfim te vejo!/ Enfim posso / Curvado a teus pés dizer-te,/ Que não cessei de querer-te/ Pesar de quanto sofri/ Muito penei!,Cruas ânsias/ Dos teus olhos afastado/ Houveram-me acabrunhado/ A não lembrar-me de ti”.
Enfim, Gonçalves Dias foi um grande vulto de sua época. Além de literato, foi jornalista, publicando em vários jornais, fundando uma revista (revista literária Guanabara), professor de latim e História do Brasil no colégio Pedro II e oficial da Secretaria de Negócios Estrangeiros.
É o que penso. E você?
Centenário de nascimento de Maria Callas: escrevendo sobre ópera
25 de Janeiro de 2024, por João Magalhães 0
No dia 2 de dezembro de 2023, o mundo da ópera comemorou os cem de anos de nascimento de Maria Callas, uma das maiores sopranos do século vinte. Maria Cecília Sofia Anna Kalogeropoulu, descendente de família grega, nasceu em Nova Iorque a 2/12/1923 e faleceu em Paris a 16/9/1977. Quando ingressou no mundo lírico, adotou o nome de Maria Callas.
Além de soprano, Callas foi também grande atriz de cinema, como o confirma o filme “Medeia”, de Pier Paolo Pasolini, no qual ela desempenha o papel da própria Medeia.
Nosso jornal, com 20 anos, ao que eu saiba nunca publicou nada sobre ópera, embora haja pessoas que a curtem. E cito nosso editor-chefe, André, nosso colunista Edésio e o Rosalvo, que infelizmente já “partiu”, a quem dedico estas linhas, lembrando os momentos em que fomos juntos ao Palácio das Artes, em Belo Horizonte, assistir a montagens de óperas. Fica ainda em minha memória a montagem espetacular dos “Pescadores de Pérolas”, de Georges Bizet (1838-1875), sobretudo o belíssimo dueto tenor/barítono de Nadir e Zurga: “au fond du temple saint”.
Meu fascínio por ópera, quase um fanatismo, começou muito cedo. Em 1952, quando entrei para o seminário (tinha 12 anos), os dois primeiros anos de ginásio eram no seminário menor dos padres camilianos, em Yomerê, distrito da cidade de Videira, no oeste do estado de Santa Catarina.
Só ia-se lá de trem, que demorava 2 dias ou mais para chegar. Nas férias, os seminaristas de lá iam para as próprias casas. Nós, paulistas e mineiros, ficávamos no seminário e os padres possibilitavam nossa frequência à biblioteca, onde podíamos ler ou ouvir músicas nos discos 78 rotações que havia lá.
Quando ouvi a abertura da ópera de “La gazza ladra”, de Gioachino Rossini (1792-1868), fiquei encantado. A melodia ficou em meus ouvidos muitos anos. Mais tarde, já em São Paulo, meu professor de literatura italiana, padre Ettore (Heitor) Nicolodi, que tinha discos de ópera, emprestou-me a “Cavalleria Rusticana”, com regência do próprio compositor, Pietro Mascagni, o tenor Beniamino Gigli, o barítono Gino Bechi, entre outros. Depois emprestou-me “Il Rigolletto”, de Verdi. A ária “tuttele feste al tempio” me marcou. Até hoje consigo solfejá-la. O coral do seminário vem reforçar quando ensaiávamos o “Va Pensiero”e “La Vergine degli Angeli”de Verdi.
Mais tarde começo a ouvir e gravar o programa “Cortina Lírica”, com o maestro Armando Belardi (1898-1989), na rádio Gazeta. Com o regente Benito Juarez, da Orquestra Sinfônica de Campinas, Carlos Gomes vem à toda com suas óperas.
Daí para diante acompanho a carreira dos grandes intérpretes. Dezenas de tenores, barítonos, baixos, sopranos, mezzo-sopranos, contraltos. Cheguei a gravar numa fita-cassete a grande ária da ópera “Tosca”, de Giacomo Puccini, “E lucevan le stelle”, com 7 tenores diferentes!
Dos mais modernos, José Carreras, Placido Domingo, Pavarotti, nem se fala. Quando Pavarotti veio pela primeira vez ao Brasil, fui assistir ao show dele. Tenho o programa até hoje.
Ópera assistida tem que ter legenda. Ópera ouvida precisa ter o libreto. Quando estive na Itália, comprei todos os libretos que achei. Encontrei muitos.
Faço minha a escrita de Nelson Rubens Kunze, editor da revista “Concerto”, ao apresentar o volume sobre a “A Ópera Tcheca” do mineiro de Belo Horizonte Lauro Machado Coelho (1944-2018), a meu ver o maior crítico musical e historiador da ópera que o Brasil já teve. Publicou, pela Editora Perspectiva, em 11 volumes, a história da ópera.
“Reunindo música, teatro, literatura, arquitetura, artes plásticas – a ópera é talvez a mais abrangente das criações, um caldeirão de emoções que representa, no palco, as mais variadas situações que o homem atravessa em sua vida.
Não é à toa que as mitologias, dos antigos gregos às lendas germânicas, enredos históricos ou tradições enraizadas no subconsciente, de riqueza e interpretações inesgotáveis, sejam o grande manancial temático dessas produções artísticas. Se a isso somarmos a realidade política e social na qual a obra de arte está inserida, os anseios e circunstâncias vividos pelo compositor, tem-se uma ideia de sua enorme complexidade.
E o fato de a ópera ser, com seu irresistível apelo emocional, uma das mais populares manifestações da cultura universal, só faz ampliar o grau de sua complexidade. Não resta dúvida de que, por sua dimensão plural e multifacetada, a ópera é o espaço privilegiado para retratar, desvendar, questionar ou exaltar artisticamente – de modo realístico ou alegórico – os mistérios da alma e da existência humana”.
É o que penso. E você?
Natal: as visitas ao recém-nascido
20 de Dezembro de 2023, por João Magalhães 0
As festividades do Natal marcam o mundo cristão, e o mundo comercial com muita antecedência começa a propagá-las. Como o ser humano se hominiza dando sentido a seus atos, deixando de ser autômato, acho eu, é necessário dar um sentido próprio a estas solenidades comemorativas.
O nascimento de uma criança, de modo especial um filho muito aguardado, costuma ser muito comemorado, muito festivo. O grupo familiar é o primeiro a acorrer para conhecer o recém-nascido. Um recém-nascido é sempre uma esperança de uma situação melhor. Até rima: criança/esperança.
E com Jesus recém-nascido, isso aconteceu? Minha fonte para esse comentário são os, assim chamados pelos estudiosos, Evangelhos da Infância, de Mateus e de Lucas. Os Evangelhos de Marcos e de João dedicam-se mais à fase adulta de Jesus e à sua vida pública.
Na narrativa de Lucas (2,1-20), embora tenha nascido em condições precárias por seus pais não haverem conseguido um alojamento decente e terem que se abrigar num refúgio de animais, seu nascimento não deixou de ser festivo. Comemorado pelos anjos, que logo avisaram os pastores da região que, à noite, vigiavam o rebanho. Foram os primeiros humanos a visitarem o recém-nascido. E qual foi o efeito? Saíram felizes, “glorificando e louvando a Deus por tudo o que tinham visto e ouvido” (Lc 2,20).
Outros visitantes foram os reis magos. Agora, a narrativa é de Mateus (2,1-12). Orientados por uma estrela guia, chegam a Belém e deixam presentes preciosos a Jesus recém-nascido: ouro, incenso e mirra. Na proposta messiânica de Mateus, a visita destes estrangeiros mostra que Jesus nasceu para o mundo todo. Os presentes dados seriam a origem da tradição de presentes de Natal às crianças? Talvez, sim. A visita dos magos deixou consequências trágicas para as crianças, da parte do sanguinário Herodes (Mt 2,16-18).
Visita emocionante foi a do justo e piedoso Simeão. “Movido pelo Espírito, ele veio ao Templo e, quando os pais trouxeram o menino Jesus para cumprir as prescrições da Lei a seu respeito, ele o tomou nos braços e bendisse a Deus, dizendo: “agora, soberano Senhor, podes despedir em paz o teu servo” (Lc 2,27-29).
Visitou-o também, no mesmo local e ocasião, a profetisa Ana. “Como chegasse na mesma hora, agradecia a Deus e falava do menino a todos os que esperavam a redenção de Jerusalém”.(Lc2,38).
Festa de aniversário inclui sempre alegria. A festa religiosa de aniversário de Jesus popularizou-se tanto que até folclorizou-se. Cada povo inseriu nela seus costumes, seus modos de comemorar. No Brasil, a missa do galo é um exemplo. Na minha infância, a nós pobres do Tijuco, aqui em Resende Costa, a única comemoração possível do Natal era assistir à missa do galo, à meia noite!
No entanto, no caso do Natal, é importante não se esquecer das posturas e lições do aniversariante. O núcleo da pregação de Jesus é a promoção do ser humano enquanto pessoa. O acolhimento e o afeto que ele deu às crianças têm que ser realçados em todo Natal.
Numa festa de aniversário da criança Jesus, é triste ver milhares de crianças abandonadas, crianças desnutridas ou passando fome, crianças sofrendo violências, crianças discriminadas pela cor da pele, crianças morrendo por não serem vacinadas, crianças órfãs que esperam uma adoção que nunca chega por causa da burocracia, crianças sem escola, crianças exploradas sexualmente, crianças forçadas ao trabalho infantil, crianças reféns ou mortas pela guerra, crianças moeda de troca etc.
É o que penso. E você?
Observação: Neste ano, completam-se 800 anos da criação do presépio por São Francisco de Assis, no Natal, em uma gruta na cidade de Greccio, em 1223.
O feriado da Consciência Negra (20 de novembro)
22 de Novembro de 2023, por João Magalhães 0
A lei federal 12.519 de 2011 instituiu o dia 20 de novembro como o Dia Nacional de Zumbi dos Palmares e da Consciência Negra. Não transformou a data em feriado nacional, mas possibilitou aos estados e municípios decretarem o feriado. Alguns estados e vários municípios já o fizeram. A data é para rememorar a força, a coragem, a resistêcia e o sofrimento que a população negra passou desde os tempos da escravidão... e passa até hoje.
Internet ligada, vi o nome de uma revista que me chamou a atenção: “TRANS/FORM/AÇÃO”. Abri. É a Revista de Filosofia da UNESP (Universidade Estadual de São Paulo). Neste número (outubro-dezembro de 2023), uma publicação com o título:“A colonização é aqui e agora: elementos de presentificação do racismo”.
A expressão “A Colonização aqui e agora” é baseada no líder indígena Ailton Krenak (*29/9/1953, Itabirinha/MG), merecidamente eleito recentemente na Academia Brasileira de Letras para a vaga do recém-falecido José Murilo de Carvalho (*8/9/1939, Andrelândia/MG; +13/8/2023, RJ).
Desse trabalho acadêmico e muito baseado em alguns autores negros eruditos, tiro algumas afirmações para incrementar a luta contra o racismo, sobretudo o racismo negro que é o mais praticado aqui em nossa terra.
A guerra contra o racismo é necessária. Precisa de punição e punição está na eficácia da lei. E lei para isso já existe: Lei 7.716/1989 – Lei do Racismo; e Lei 14.532/2023, cuja principal novidade é que agora a injúria racial passa a ser equiparada ao crime de racismo. Sendo assim, passa a ter pena de reclusão de 2 a 5 anos e multa. Além disso, agora, os crimes de injúria racial são imprescritíveis, ou seja, podem ser julgados em qualquer tempo, independentemente da data em que foram cometidos.
Precisa de muita luta, pois, como mostra a séria pesquisa da faculdade baiana de direito ( Jornal da TV Cultura, 24 de outubo de 2023), a punição, quando existe, é muito branda, sendo que na maioria dos casos o juiz é complacente. A certeza de impunição é que alimenta o racismo. “O racismo, enquanto problema estrutural e estruturante de nossa sociedade, afeta-nos cotidianamente de formas muito profundas e nem sempre visíveis”. Endosso esta frase do texto da revista, acima citada.
E volto a citá-la: “Nesse sentido, o presente texto parte da pergunta fundamental: como o racismo se faz presente, nos dias de hoje? E a desdobra em outras perguntas, que giram em torno desse eixo central. São elas: por que temos dificuldade em perceber esse problema? Como o racismo e o capitalismo se relacionam historicamente? Como esse problema afeta, em especial, as mulheres negras, as quais estão na base da pirâmide do sistema”?
Para tentar dar conta dessas perguntas, mesmo intelectualmente, há muito a se fazer. A começar pela identificação e recriação da conduta e pensamento viciados que relegam o ser negro, ser indígena e ser periférico à condição de não ser.
“O presente artigo tem por objetivo analisar os modos a partir dos quais o racismo se faz presente, em nossa sociedade, enquanto Sul Global e herdeira do sistema escravista. Sendo esses modos muito diversos e impossíveis de serem tratados de maneira completa, foram definidos aqui três eixos principais para abordá-los: 1) a colonialidade como base da modernidade (colonialidade é um conceito que se refere aos efeitos duradouros e estruturais do colonialismo nas sociedades contemporâneas. Portanto, mantém-se após a experiência colonial); 2) a precarização da força de trabalho no neoliberalismo; e 3) as imagens paradigmáticas e aprisionadoras da mulher negra, na sociedade brasileira”.
Quanto ao terceiro item: as imagens paradigmáticas da mulher negra, na sociedade brasileira: mulata, doméstica e mãe preta, há uma palestra-performance (“Descolonizando o Conhecimento” MIT, SP 2016) da portuguesa Grada Kilomba (negra) onde ela fala: “Há esta anedota: uma mulher negra diz que ela é uma mulher negra. Uma mulher branca diz que ela é uma mulher. Um homem branco diz que é uma pessoa”.
Num jogo simples com a plateia, Grada Kilomba demonstra o silenciamento imposto pelo sistema racista. Pediu aos espectadores que conversassem entre si por alguns minutos enquanto ela continuaria a palestra. A situação de falar e não ser ouvida que se estabeleceu então no teatro é análoga à condição de silenciamento de sujeitos na sociedade. Não lhes é concedida a escuta.
É o que penso. E você?